Ryan sempre pegava o mesmo ônibus no fim da tarde, sentava no mesmo lugar — o terceiro banco da direita, perto da janela —, colocava os fones e deixava a cidade passar como um filme calmo. Naquele dia, o banco era dele mais uma vez, e tudo parecia comum, até que o veículo parou bruscamente no próximo ponto e entrou um garoto com um menininho no colo.
O garoto, bonito, com o cabelo um pouco bagunçado e expressão de quem tava tentando não surtar, olhou ao redor procurando um lugar. O ônibus estava cheio. Ryan hesitou por um segundo, mas logo se levantou e ofereceu o assento.
— Pode sentar — disse, com um sorriso simpático.
O garoto balançou a cabeça, recusando.
— Obrigado, mas só preciso de um favor… pode segurar ele um minutinho?
Ryan arregalou os olhos, surpreso. Mas antes que pudesse dizer qualquer coisa, o menininho já estava em seus braços, sorrindo pra ele como se fossem velhos amigos. Ryan riu.
— Tá, né. Oi, pequeno.
O garoto sentou no chão do ônibus, entre os pés das pessoas, e ficou ali, respirando fundo. Depois de alguns minutos, ergueu os olhos.
— Obrigado. Eu sou o Lucas. E esse pentelhinho aí é o Caio.
— Ryan — ele respondeu, balançando a mão do Caio, que agora brincava com o cordão do seu moletom. — Prazer.
A partir dali, os três passaram a se esbarrar constantemente. Ryan começou a escolher horários em que sabia que Lucas estaria no ônibus, e Lucas parecia fazer o mesmo. Às vezes vinham conversando o caminho inteiro. Outras, Ryan ajudava a segurar Caio enquanto Lucas cochilava encostado no vidro.
E um dia, quando Caio dormiu no colo de Ryan, Lucas ficou encarando os dois com um sorrisinho meio bobo.
— Você leva jeito pra isso, sabia?
— Pra criança? — Ryan perguntou, rindo.
— Pra gente.
Ryan olhou pra ele, sem entender.
— "Gente"?
— Tipo... pra "a gente". Nós dois. Você e eu. — Lucas disse, abrindo um sorrisinho safado. — Se quiser, claro.
Ryan fingiu pensar.
— Só se você pagar o lanche.
— Feito.
Depois disso, tudo mudou, mas de um jeito suave. Ainda pegavam o mesmo ônibus, ainda falavam sobre besteiras e dividiam o fone. Mas agora tinha olhares demorados, mãos que se procuravam, e uma tensão boa pairando entre eles. Um dia, quando o ônibus passou por um túnel escuro, Ryan sussurrou:
— Se você não me beijar agora, eu vou te provocar até você não aguentar mais.
Lucas virou o rosto, desafiando:
— Você fala demais.
Foi o suficiente. Os lábios se encontraram ali mesmo, entre um ponto e outro, com o Caio dormindo no banco da frente e a cidade lá fora sem a menor importância.
E assim, entre uma parada e outra, uma troca de assentos, um favor improvável e muitas viagens, Ryan e Lucas seguiram em direção ao que nem sabiam que estavam procurando: o ponto final de um ônibus, mas o começo de uma história.