Os salões da Mansão Amaral não eram apenas uma extensão de poder; eram como os corredores de um templo de ouro e ferro, onde os herdeiros caminhavam com a herança do medo e do prestígio nos ombros. No silêncio das madrugadas, quando até os fantasmas pareciam respeitar os segredos da casa, era possível ouvir o som abafado dos passos firmes de Dante Amaral.
Frio, meticuloso, o primogênito de Aslan e Ayla carregava em si o peso de ser o sucessor natural. Tinha a elegância de um príncipe, mas o olhar de um homem moldado para a guerra. Dante não se apegava. Para ele, amor era fraqueza. O que ele tinha com Rilary — uma loira de beleza venenosa, corpo curvilíneo e olhar provocante — era apenas um acordo silencioso de carne e ausência de sentimentos.
A presença de Rilary irritava Ayla até a alma. Aurora, por sua vez, não suportava nem ouvir o nome da garota. Achava-a vulgar, manipuladora. Uma má influência para alguém tão calculado quanto Dante. Mas ele pouco se importava. Mantinha Rilary por perto como quem carrega uma arma de reserva: perigosa, mas útil quando o desejo falava mais alto.
Na mesma casa, mas em universos distintos, Noah Amaral era o oposto. Baladeiro, imprudente e adoravelmente insuportável. Vivia de festa em festa, beijando bocas desconhecidas, rindo alto e quebrando regras. Era o tipo de homem que se apaixonava toda sexta e esquecia o nome da garota no sábado. Nunca dormia com a mesma duas vezes. Ele era carisma e caos em uma só pele, e não fazia questão de esconder isso.
— Eu não sou como o Dante — dizia, rindo com um copo de uísque na mão. — Ele é o túmulo da emoção. Eu sou o carnaval da perdição.
Yara, a mais misteriosa dos irmãos, era um enigma sensual. Fria como o gelo, com uma postura dominante e roupas provocantes que faziam qualquer um — homem ou mulher — virar o rosto. Ela sabia que era desejada e usava isso como uma armadura. Nunca se envolvia demais. Era intensa nos olhares, mas inacessível no coração. Ela era o tipo de mulher que deixava marcas de batom em taças de vinho e memórias em lençóis de estranhos, sem jamais repetir um rosto.
— Se apaixonar é dar ao outro o poder de destruir você — ela dizia. — Eu prefiro ser a destruidora.
Aurora, por outro lado, era uma contradição deliciosa. Comportada à primeira vista, usava saias longas, cabelos impecavelmente penteados e um sorriso discreto. Mas quando ninguém esperava, soltava a fera. Colocava um decote ousado, aumentava o volume da música e começava a dançar pela sala como se estivesse hipnotizando o próprio destino. Era doce, mas tinha veneno na ponta dos dedos. Ela provocava Dante, tirava Noah do sério, ria das provocações de Yara. Era o equilíbrio caótico da casa.
Naquela noite, os quatro estavam reunidos na sala, algo raro de acontecer. Aslan e Ayla haviam saído para uma viagem rápida. A casa pertencia a eles — os herdeiros.
Dante estava de pé, ao lado da lareira, com uma taça de conhaque na mão. Observava Aurora rebolando ao som de uma música latina.
— Você precisa parar com isso — disse ele, sério.
— Por quê? Tá com medo de aprender a dançar, irmão? — respondeu ela, sorrindo maliciosamente.
— Você parece uma maluca — resmungou Noah, largado no sofá com uma garrafa de cerveja. — Mas é engraçado. Vai, dança aí.
Yara se aproximou da parede de vidro, olhando o jardim escuro além da mansão.
— Vocês são todos palhaços. Nenhum de vocês tem noção do que carrega no sobrenome.
— E você acha que desfilar com vestido colado e batom vermelho é carregar o legado da máfia? — provocou Noah.
Yara virou-se lentamente, seu olhar era de puro gelo.
— Pelo menos eu não sou um palhaço bêbado que vive de curtir e esquece que nosso pai construiu um império com sangue.
— E você é o quê? A princesa da escuridão? — ele retrucou, rindo.
— Chega! — Dante interrompeu, com a voz baixa, mas tão firme que todos silenciaram. — Estamos todos na mesma casa. Se vamos nos destruir, que seja lá fora, não aqui dentro.
Aurora abaixou o volume da música, ainda com um sorriso travesso.
— O Dante falando de paz... isso é novo.
Ele não respondeu. Apenas encarou a lareira, como se dentro do fogo houvesse uma lembrança que ninguém mais podia ver.
Mais tarde naquela noite, Dante saiu para uma reunião com aliados da família. Enquanto isso, Noah se trancou no quarto com o som alto. Yara pegou o carro e saiu para um bar secreto que apenas ela conhecia. Aurora ficou sozinha, dançando no escuro, perdida em seus pensamentos e desejos não ditos.
A madrugada caía como uma cortina de veludo sobre a mansão Amaral. E mesmo no silêncio, era possível sentir que algo estava por vir. Algo grande. Algo que mudaria para sempre a vida dos filhos do império.
A Mansão Amaral parecia mais silenciosa naquela manhã, mas não era calmaria — era apenas o tipo de quietude que precede o caos.
Dante estava no escritório, como sempre. Os dedos deslizavam pelas páginas de um relatório sobre transações internacionais de uma das empresas da família. O maxilar travado, o olhar impassível.
— A única coisa que me prende aqui é o controle. Emoção não entra nessa equação — murmurou para si mesmo, sem perceber que Rilary estava parada na porta, observando.
Ela vestia uma camisa dele, soltinha, com o cabelo bagunçado da noite anterior.
— Só o controle? — ela provocou, entrando devagar. — Pensei que eu fosse um pouco mais interessante que papelada.
Dante não desviou o olhar das folhas.
— Você é útil quando quero esquecer que estou vivo. Nada mais.
A frase cortou como lâmina. Rilary riu, mas os olhos brilharam de dor.
— E mesmo assim, você volta pra mim todas as noites, Dante.
Ele finalmente a encarou. Olhos cinzentos, gélidos.
— Porque seu silêncio combina com o meu.
**
No outro lado da casa, Noah se jogava no sofá com uma ressaca pulsando no crânio. Estava sem camisa, o cigarro meio apagado entre os dedos.
Aurora passou dançando com um copo de suco, usando apenas um short e uma regata fina demais para o café da manhã.
— Baixa essa música mental, playboy — ela zombou. — Tua cara tá gritando socorro.
— Cale a boca, safada disfarçada — ele retrucou, cobrindo o rosto com uma almofada. — Você ainda vai acabar grávida do entregador de pizza com essa dança no corredor.
Aurora riu alto.
— Melhor do que pegar DST todo fim de semana nas suas baladas.
— Inveja é um sentimento feio, maninha — respondeu ele, jogando uma bolacha nela.
**
Yara, por sua vez, estava deitada ao sol na beira da piscina. Um biquíni preto, óculos escuros e um livro de psicologia criminal nas mãos.
Um segurança novo passou por ali, e ela nem precisou dizer nada. Apenas cruzou as pernas, provocante, e o olhar do homem caiu sobre ela como se fosse feitiço.
Ela sorriu de canto.
— Se vai me encarar assim, pelo menos traga gelo com limão. E rápido.
A beleza dela era perigosa. Mas o que assustava mesmo era a frieza no coração. Ela gostava do poder, não das pessoas. Só amava os irmãos e os pais. O resto? Apenas distrações.
**
No fim do dia, Aurora estava na sala, dançando sozinha ao som de reggaeton. O decote generoso balançava conforme os passos calculados, sensuais. Ela sabia o que fazia — era sua válvula de escape.
Yara passou atrás, rindo.
— E ainda me chamam de provocante.
— Eu sou recatada até as sete — respondeu Aurora, rebolando ainda mais. — Depois disso, eu viro o próprio pecado.
Aslan passou pela porta e parou por um segundo, arqueando a sobrancelha.
— Vocês não têm uma faculdade pra frequentar, não?
Aurora sorriu.
— Já fui. Voltei melhor. Quer ver o boletim?
Aslan soltou um suspiro e seguiu. Ele sabia que os filhos estavam crescendo em mundos diferentes. E que cada um era um espelho partido de tudo que ele foi um dia.
**
No jantar, Ayla observava cada um deles em silêncio.
Dante comendo em silêncio ao lado de Rilary, que fingia fazer parte da família.
Noah rindo de uma piada que ele mesmo contou.
Aurora mexendo no celular, com a maquiagem ainda perfeita.
Yara encarando todos como se analisasse um bicho raro.
— Vocês são lindos... e selvagens. — Ayla comentou, sorrindo de forma doce.
— Obrigada, mãe. É o DNA de guerra — Noah respondeu, erguendo a taça.
— E de promessas — completou Dante, sem emoção. — Só que nem todas foram cumpridas.
A mesa ficou em silêncio por alguns segundos.
Mas o que ninguém sabia era que o destino já estava em movimento. E os caminhos de cada um estavam prestes a cruzar com algo — ou alguém — que mudaria o rumo de tudo que acreditavam.
**
Naquela noite, Rilary acordou sozinha na cama de Dante. Ele estava no terraço, olhando para a cidade, com um copo de uísque e um olhar perdido.
Noah saiu novamente, desta vez sozinho. Não queria companhia, queria confusão.
Yara foi vista pela câmera de segurança entrando no carro de um advogado vinte anos mais velho.
Aurora? Ela dançava em frente ao espelho, experimentando lingeries novas, só para saber até onde sua ousadia poderia chegar.
E no meio de tudo isso, Ayla e Aslan sabiam:
Os filhos do caos estavam prontos para começar suas próprias guerras.
---
A cafeteria no centro do Rio de Janeiro estava movimentada naquele fim de tarde. Chovia fino, e o cheiro de café fresco misturava-se ao de páginas molhadas de livros esquecidos sobre as mesas.
Dante chegou com o semblante carregado, o paletó negro encharcado nos ombros, a pasta de couro numa das mãos e o celular pressionado na outra.
— Eu falei que era às quatro em ponto. Eu odeio atraso! — rosnou ele, desligando a chamada com força e empurrando a porta de vidro com brutalidade.
No caminho até a mesa reservada, não percebeu a figura delicada parada bem no centro do corredor, equilibrando um copo de latte e um prato com torta de limão.
Tudo aconteceu rápido. Dante esbarrou nela com o ombro, e o impacto fez a garota tropeçar. O café caiu direto no chão, a torta voou... e parte do líquido espirrou no próprio terno caro.
— Droga! — ele vociferou, olhando para a mancha no tecido. — Olha por onde anda, porra!
A garota o encarou de cima a baixo, os olhos faiscando em um tom de verde acentuado pela raiva.
— Olha você! — ela rebateu sem medo, empurrando o peito dele com as duas mãos. — É assim que entra nos lugares? Achando que o mundo se curva pro seu mau humor?
Dante, surpreso, deu um passo para trás, mas logo o orgulho o fez se reerguer, encarando-a de cima.
Ela era pequena, talvez 1,60 de altura, mas sua presença preenchia o espaço como se tivesse dois metros.
— Quem é você? — ele perguntou, seco, limpando a manga com nojo.
— A mulher que você derrubou. E que, por sinal, pagou quarenta reais por esse café que você acaba de destruir. — Ela cruzou os braços, o queixo empinado.
— Manda a conta. — Ele puxou a carteira com desdém.
— Ah, não, querido. Não é sobre dinheiro. É sobre educação. Algo que você parece ter perdido no berço.
Dante ficou em silêncio por um segundo. Ninguém falava assim com ele. Ninguém o enfrentava.
E ali estava ela — molhada de café, furiosa... e absurdamente linda.
Cabelo preso em um coque bagunçado, pele clara, bochechas coradas pela irritação. Vestia uma calça jeans de cintura alta e uma blusa social branca, agora levemente manchada, mas ainda assim impecável.
Antes que ele respondesse, um dos sócios se aproximou da mesa.
— Dante, tudo bem? Essa é nossa nova colaboradora jurídica. Chegou hoje. Veio direto da França.
Ele ficou imóvel. Engoliu em seco.
— França? — murmurou.
A garota estendeu a mão, o sarcasmo ainda nos olhos.
— Luna Delacroix. Advogada. E, infelizmente pra você, seu novo pesadelo profissional.
Dante a encarou por longos segundos. A raiva dentro dele não se dissipava, mas agora... vinha misturada a um interesse sombrio. Ela era diferente. Impertinente. E desafiadora.
— Dante Amaral. Sócio majoritário. — respondeu, apertando a mão dela com firmeza. — E espero que você goste de trabalhar sob pressão.
— Desde que a pressão não venha acompanhada de café derramado e grosseria... acho que vou sobreviver. — Ela sorriu de lado.
**
Enquanto isso, na mansão Amaral...
Rilary mandava selfies de biquíni de uma praia paradisíaca no Nordeste. Aurora revirava os olhos a cada notificação.
— Essa garota precisa entender que não faz parte da família. — murmurou. — Só é sexo casual. E olha lá...
Noah riu alto do outro lado do sofá.
— Sexo casual com o Dante é o mais longe que alguém consegue chegar. Ele é o próprio iceberg.
Yara, sentada na poltrona, ergueu uma sobrancelha.
— Vamos ver se continua assim depois que ele encontrar alguém que afogue esse gelo todo.
**
De volta à cafeteria, Dante observava Luna se afastar após a reunião, a saia rodando levemente ao vento.
Ele sorriu pela primeira vez no dia. Um sorriso breve, quase imperceptível... mas perigoso.
Porque Dante não acreditava em destino.
Mas algo nele sabia: aquela mulher ia virar tudo de cabeça pra baixo.
---
Para mais, baixe o APP de MangaToon!