Em uma pequena aldeia aninhada entre as colinas verdejantes, onde o cheiro de terra molhada se misturava ao doce perfume das flores silvestres, viviam Lira e Kael. Lira, com seus cabelos ruivos que caíam em ondas suaves e seus olhos de um verde profundo e expressivo, era a personificação da primavera, mas com uma intensidade silenciosa que poucos percebiam. Um leve salpico de sardas dançava sobre seu nariz delicado, e sua postura, apesar de não ser alta, era sempre ereta e graciosa, com movimentos leves e ágeis. Kael, por outro lado, era um jovem de compleição forte, com ombros largos que já anunciavam o cavaleiro que ele viria a ser. Seus cabelos castanho-escuros e ligeiramente rebeldes emolduravam um rosto de traços marcantes, e os olhos, de um azul penetrante, refletiam sua determinação e uma lealdade inabalável.
Amigos inseparáveis desde que se entendiam por gente, eles compartilhavam segredos sob o manto estrelado e sonhavam com aventuras além dos limites do vilarejo. Lira, no entanto, nutria em segredo um amor que ia além da amizade por seu companheiro de todas as horas. Kael, por sua vez, era um espírito impetuoso e nobre, sonhava em empunhar uma espada e defender os inocentes, tal como os antigos cavaleiros das lendas.
O dia da partida de Kael chegou com o sol mais triste que Lira já vira. Ele havia sido aceito na renomada Ordem dos Cavaleiros, um destino glorioso que o levaria para longe, para um treinamento rigoroso e perigoso. Antes de montar em seu cavalo, Kael a puxou para um abraço apertado e entregou a ela uma adaga. A lâmina brilhava com um tom prateado único, forjada em puro aço élfico, o mesmo material de sua própria espada que pendia em sua cintura.
"Para você, Lira", ele disse, os olhos fixos nos dela. "Para que se lembre que eu voltarei. E quando eu voltar, farei de você a minha escudeira, a minha parceira em todas as aventuras. Juntos, defenderemos este mundo."
A promessa de Kael foi um bálsamo para o coração de Lira, mas também um peso. Ela via ali a concretização de um futuro ao lado dele, não apenas como escudeira, mas como algo mais profundo. O aço élfico em suas mãos era frio, mas a esperança que aquecia seu peito era imensa. Ela esperaria. Esperaria não só pela volta do amigo, mas pela chance de revelar o amor que guardava e construir uma vida que ia muito além das promessas de escudeiros.
No entanto, o destino, como sempre, tinha planos muito mais sombrios e inesperados para a jovem Lira. Planos que transformariam a garota apaixonada em algo que Kael, o futuro cavaleiro, seria jurado a caçar.
Os anos se estenderam, e com eles, a promessa de Kael permaneceu o farol na vida de Lira. Longe do olhar do amigo, ela seguiu o caminho que ele traçara para ela. Com a adaga de aço élfico sempre à mão, Lira transformou o quintal de sua casa e os arredores do vilarejo em seu campo de treinamento particular. Dia após dia, ela praticava os movimentos que imaginava um escudeiro precisaria: agilidade, precisão e a capacidade de se defender. Seus cabelos ruivos eram frequentemente emaranhados com folhas e terra, e seus olhos verdes profundos mostravam uma determinação feroz, muito diferente da doçura inocente de sua infância. Cada golpe, cada passo, era um investimento no futuro que ela esperava construir ao lado de Kael, não apenas como sua escudeira, mas como a mulher que ele amaria.
Mas à medida que Lira crescia em força e habilidade, uma sombra sutil começou a se estender sobre a aldeia. Contos sussurrados de viajantes sobre criaturas da noite se tornaram mais frequentes, e os moradores começaram a trancar suas portas mais cedo. No entanto, o verdadeiro terror irrompeu uma noite.
Um grito agudo rasgou o silêncio da madrugada, e um pavor gélido agarrou o coração de Lira, arrancando-a de um sono inquieto. Sem hesitar, ela saltou da cama, a adaga de aço élfico que Kael lhe dera já em sua mão. Do lado de fora, a noite estava tensa, pesada com um cheiro de ferro, um odor pungente que ela reconheceu como sangue. Os outros aldeões permaneciam em suas casas, portas trancadas, janelas escuras, ignorando o terror que pairava. Mas Lira não era como eles. Ela era a futura escudeira de Kael, e um escudeiro não recuava diante do perigo.
Seguindo a trilha escura de gotas escarlates que serpenteava pela terra, Lira apurou os sentidos, a lâmina fria em sua palma servindo de âncora. A cada passo, o cheiro de sangue se intensificava, levando-a a uma clareira macabra nos arredores do vilarejo. A cena que se desenrolou sob o pálido luar fez o estômago de Lira se revirar e o ar lhe faltar.
Ali, curvada sobre um corpo inerte, estava uma criatura colossal, parecida com um morcego, mas de dimensões aterrorizantes. Suas asas escuras e membranosas agitavam-se suavemente, e suas presas, assustadoramente longas, estavam cravadas profundamente na garganta de uma mulher. Lira precisou de um instante para reconhecer o rosto familiar da bondosa Ana, a costureira, uma amiga. Mas o reconhecimento veio acompanhado de um choque ainda mais brutal: a criatura mordera com tanta força que a cabeça de Ana, com os olhos ainda arregalados em um terror mudo, desprendeu-se do corpo e rolou com um baque abafado, parando aos pés de Lira.
A cena que se descortinou diante dos olhos de Lira gravou-se em sua mente como uma cicatriz de brasa. O terror atingiu Lira em ondas geladas, mas a determinação forjada em anos de treinamento solitário falou mais alto que o medo. A visão da cabeça de Ana, com os olhos ainda arregalados em terror, acendeu uma fúria fria no peito de Lira.
Empunhando a adaga de aço élfico com as mãos trêmulas, mas firmes, Lira avançou, a lâmina prateada captando a luz da lua. A criatura, banqueteando-se em sua hedionda refeição, pareceu não notar a presença da jovem a princípio. Mas quando Lira gritou, um grito carregado de raiva e luto, o monstro ergueu a cabeça, revelando olhos vermelhos e famintos. Gotas de sangue escorriam de suas presas alongadas, pingando na terra encharcada.
O terror ancestral emanava da besta, paralisando qualquer um que ousasse encará-la. Mas no coração de Lira, a dor pela perda de Ana e a promessa feita a Kael se fundiram em uma resolução inabalável. Ela não era mais apenas a garota que esperava por seu amigo. Naquela noite sombria, Lira se tornaria uma defensora, mesmo que a criatura à sua frente fosse muito mais poderosa do que qualquer coisa que ela poderia ter imaginado.
Lira soltou um grito de guerra primal, um som que ecoou pela clareira manchada de sangue, misturando a fúria pela perda de Ana com a determinação forjada em anos de espera. Empunhando a adaga de aço élfico como uma extensão de sua própria vontade, ela avançou contra a monstruosidade. Seus cabelos ruivos chicoteavam ao vento enquanto ela corria, os olhos verdes fixos nos vermelhos famintos da criatura.
Num salto ágil e desesperado, impulsionado pela adrenalina e pelo desejo de vingança, Lira arremeteu-se contra a besta. A adaga de aço élfico em suas mãos brilhou sob o luar, pronta para perfurar e rasgar a pele coriácea da criatura. Ela mirou a garganta, o ponto mais vulnerável que podia alcançar.
No entanto, a agilidade de Lira não passou despercebida. Com um movimento rápido e brutal de uma de suas asas membranosas, a criatura golpeou Lira no ar, como se fosse uma boneca de pano. O impacto a arremessou com violência contra o chão, o ar sendo momentaneamente arrancado de seus pulmões. Uma dor lancinante percorreu suas costas, mas a determinação a impulsionou a se levantar quase que instantaneamente.
A besta aproveitou a oportunidade e lançou um ataque direto, suas garras afiadas como navalhas rasgando o ar na direção de Lira. Com um reflexo surpreendente, fruto de seu treinamento incessante, Lira desviou por um triz, sentindo o vento cortante das garras roçar sua pele. Ela cambaleou para trás, mas manteve a adaga firme.
Em um movimento audacioso, Lira usou sua agilidade para se impulsionar novamente. Correndo lateralmente, ela evitou outro ataque da criatura e, com um salto calculado, escalou o corpo da besta, agarrando-se às suas cerdas escuras e ásperas. Com um grito de esforço, ela elevou a adaga acima da cabeça e, com toda a sua força, perfurou a garganta da criatura.
Um som gutural e horrendo escapou da garganta da besta, um borbulho de sangue escuro e espesso. A criatura se debateu violentamente, suas garras arranhando o ar, tentando se livrar do ataque mortal. Lira segurou firme, a lâmina da adaga afundando cada vez mais fundo. O cheiro de sangue se intensificou, quente e nauseante. Finalmente, com um último espasmo, o corpo da criatura tombou para o lado, inerte, esmagando a vegetação sob seu peso.
Lira cambaleou para longe do corpo da besta, ofegante e trêmula, mas vitoriosa. A adaga em sua mão estava encharcada de sangue escuro. Ela olhou para o corpo de Ana, depois para a criatura caída, e uma onda de exaustão e tristeza a atingiu. Mas no meio do alívio, uma pontada estranha percorreu seu corpo, uma sensação de que algo havia mudado dentro dela.
Um calafrio percorreu a espinha de Lira, mesmo com o corpo ainda quente da batalha. A sensação estranha que a invadira foi abruptamente interrompida por uma presença sinistra. Uma sombra surgiu por trás dela, silenciosa como a noite, e mãos frias e fortes agarraram seu pescoço, elevando-a do chão como uma pena. O ar foi instantaneamente cortado de seus pulmões, e a adaga ensanguentada escorregou de seus dedos, caindo na terra úmida com um baque suave.
Uma voz fria e calculista ecoou em seus ouvidos: "Então você matou meu bichinho, não é?"
Lira debateu-se, tentando desesperadamente se libertar do aperto mortal, mas era inútil. Seus olhos arregalados encontraram o rosto de seu algoz: um ser de pele pálida como a cera, emoldurado por longos cabelos negros que dançavam na brisa noturna. Seus olhos... eram de um vermelho intenso, faiscando com uma malevolência antiga e insaciável. Ele a olhou de cima a baixo, com um escrutínio frio e avaliador.
"Interessante", sibilou o estranho, sua voz carregada de um sotaque arrastado e exótico. "Você tem uma determinação forte... Talvez você sobreviva no fim das contas." Um sorriso lento e sinistro curvou seus lábios finos, revelando dentes anormalmente brancos e ligeiramente alongados.
Lira tentou falar, implorar por sua vida, mas o estrangulamento impedia qualquer som de sair de sua garganta. Seus pulmões imploravam por ar, e a escuridão começava a dançar nos cantos de sua visão.
Com um movimento surpreendente, o homem a desceu bruscamente no chão, liberando a pressão em seu pescoço. Lira tossiu, engolindo ar com avidez, enquanto tentava recuperar o equilíbrio. Antes que pudesse reagir, fugir ou sequer levantar a adaga caída, o homem agiu novamente.
Ele agarrou a mão de Lira que ainda crispava, lembrando-se da adaga de aço élfico. Com um movimento fluido e inesperado, ele envolveu seu outro braço ao redor da cintura trêmula da jovem, puxando-a para perto em uma dança macabra. Lira tentou se afastar, mas a força do homem era muito superior à sua.
Então, ele a inclinou levemente para trás, um sorriso predatório se alargando em seu rosto pálido, exibindo agora presas enormes e afiadas, gotejando com uma saliva escura e viscosa. O terror gelou o sangue de Lira quando ela compreendeu a natureza da criatura que a subjugava.
Num instante horripilante, as presas afiadas cravaram-se em seu pescoço. Uma dor lancinante explodiu, misturando-se a uma sensação estranha e inebriante enquanto seu sangue quente era violentamente sugado por aquela criatura da noite. A escuridão finalmente a engoliu por completo, enquanto o veneno e a essência vampírica se espalhavam por suas veias, selando seu destino sombrio.
A escuridão a envolveu como um manto frio, e Lira caiu no vazio, a dor e o horror a consumindo. Quando a consciência retornou, foi como emergir de um pesadelo borrado. Um cheiro denso e nauseante invadiu suas narinas: fumaça e sangue, muito sangue. Sons distorcidos e amplificados ecoavam em seus ouvidos – estalos de madeira queimando, gemidos distantes que ela mal podia discernir. Todos os cheiros e sons, antes sutis, agora a bombardeavam com uma intensidade avassaladora.
Lira se levantou com dificuldade, sentindo uma fraqueza estranha, uma fome que roía suas entranhas de uma forma que nunca sentira antes. Sua adaga, surpreendentemente, estava a seus pés. Ela a agarrou, a familiaridade do aço élfico sendo o único consolo naquele caos sensorial. Cambaleando, ela seguiu o rastro de destruição até a entrada de seu vilarejo.
O que viu ali gelou o resto de qualquer calor que ainda existia em seu corpo. A aldeia que Kael e ela haviam prometido defender estava em ruínas. Casas em chamas lançavam sombras dançantes sobre os corpos espalhados pela terra. Gargantas rasgadas, cabeças arrancadas, entranhas expostas – a cena era um pesadelo materializado. Eram seus vizinhos, seus amigos, brutalizados além do reconhecimento.
"O-O que foi que aconteceu aqui?" Lira murmurou, sua voz rouca e estranha, a garganta seca e arranhada como papel. O horror era tão grande que parecia irreal.
Ela se ajoelhou no chão lamacento, em meio à desolação. Mas, surpreendentemente, nenhuma lágrima escorreu de seus olhos verdes. Nenhuma pontada de tristeza a atingiu como deveria. Seu corpo não reagia. Uma frieza estranha a preencheu, substituindo a dor que deveria sentir. Era como se a capacidade de sentir luto, de chorar pela perda de tudo que conhecia, tivesse sido arrancada dela junto com seu sangue. Apenas a fome e o vazio restaram.
O silêncio do luto de Lira, um vazio estranho e aterrorizante dentro dela, foi abruptamente rasgado. Uma voz, tão familiar quanto as batidas de seu próprio coração em outro tempo, ressoou por entre os escombros.
"Lira... É... É você mesma?"
A jovem ergueu a cabeça, seus olhos verdes antes expressivos, agora distantes, fixando-se sobre o ombro. Ali estava ele, emoldurado pela fumaça e pela destruição: um homem bonito, com ombros largos e uma postura nobre, vestido em uma armadura de couro com detalhes metálicos, a espada embainhada à sua cintura. O cabelo, um castanho escuro e ligeiramente rebelde, era inconfundível. Era Kael.
As palavras saíram de sua garganta com dificuldade, um sussurro rouco que mal se ouvia sobre o crepitar das chamas. "Ka... Kael?" Lira mal o reconhecia, não apenas pela armadura, mas pela dor que se estampava em seu rosto, uma dor que ela própria não conseguia sentir. Seu estômago roncou, alto e inoportuno, um lembrete cruel da sede que a corroía.
Kael deu um passo à frente, os olhos azuis penetrantes varrendo a cena de horror, antes de se fixarem nela, buscando uma explicação. "O que houve aqui, Lira? O que aconteceu com nossa família, nossos amigos?"
Com grande dificuldade, Lira abriu a boca para responder, as palavras presas em sua garganta seca. Mas, ao tentar formar um som, suas presas, já alongadas e afiadas, expuseram sua terrível nova identidade. Kael viu. Os olhos azuis penetrantes que um dia a olharam com carinho agora se arregalaram em choque e uma incredulidade dolorosa.
Ele recuou um passo, sua mão instintivamente procurando o cabo da espada. "O-O que aconteceu com você? Você..." A voz de Kael falhou. Seus olhos varreram a cena de destruição mais uma vez, parando nas gargantas rasgadas de seus amigos e familiares, depois retornando ao sangue que manchava as roupas de Lira. Uma fria compreensão, um temor profundo e desesperador, invadiu seu rosto. Não era um medo de covardia, mas o pavor de aceitar uma verdade cruel demais para ser processada.
"Lira... Você os matou?" perguntou Kael, a voz embargada por uma dor quase maior que o horror. Era o temor de aceitar que sua melhor amiga de infância, a garota que ele prometera proteger e que o esperava, havia se tornado o monstro responsável por toda aquela carnificina, por ter exterminado suas famílias e destruído o lar que ambos conheciam.
Uma parte de Lira, a Lira antiga, a garota que amava Kael, queria gritar a verdade, explicar a dor, o ataque do monstro-morcego, o vampiro sombrio que a transformara. Mas sua garganta estava seca, sua voz rouca, e a fome, uma fome insuportável e predatória, começou a dominar cada pensamento.
Os olhos de Kael, azuis e cheios de uma dor que Lira não podia mais sentir, a fixavam, esperando por uma resposta. A adaga de aço élfico estava a poucos passos, caída no chão. Ele já empunhava a espada. O mundo se tornou uma névoa, a fumaça das casas queimando misturou-se com o cheiro opressor de sangue. O que Kael via era uma imagem irrefutável: Lira, de pé em meio à carnificina, com presas à mostra e sangue em suas roupas.
A frieza que a invadira mais cedo agora se solidificava, roubando qualquer resquício de remorso ou tristeza. Em vez disso, uma raiva gélida começou a borbulhar. Raiva por Kael, por sua acusação, por sua incapacidade de entender o horror que ela havia suportado. E, por baixo de tudo, a sede. Uma sede tão intensa que a visão do sangue em suas próprias roupas, o sangue de seus antigos vizinhos, de sua antiga vida, tornou-se algo tentador.
Lira não respondeu com palavras. Em vez disso, um grunhido baixo e gutural escapou de sua garganta, um som estranho e não humano. Seus olhos verdes, antes expressivos, agora brilhavam com um fulgor antinatural, fixos em Kael, não mais como um amigo, mas como uma presa em potencial. A fome a estava cegando.
"Agora não tenho mais nenhuma dúvida... Lira, me desculpe, mas a minha amiga não existe mais." A voz de Kael, embora quebrada pela dor, era firme e resoluta. Com um movimento ágil, ele desembainhou sua espada de aço élfico, a lâmina polida reluzindo perigosamente sob a luz bruxuleante dos incêndios.
Por um instante, Lira conseguiu se conter. A Lira que o amava travou uma batalha silenciosa contra a escuridão que a invadia. Mas a fome, agora uma criatura gritante em seu interior, e a raiva pela traição implícita na espada desembainhada de Kael, a empurraram ainda mais para o limite. Sua postura graciosa deu lugar a uma tensão predatória. Com uma velocidade sobrenatural, quase um borrão, Lira avançou até sua adaga caída e a agarrou, a lâmina de aço élfico parecendo vibrar em sua palma.
Kael não hesitou. Seu treinamento de cavaleiro era um reflexo, e vendo a velocidade e a fúria nos olhos de Lira, ele não esperou. Ele já estava sobre ela, a espada levantada, prestes a desferir um golpe fatal que cortaria sua cabeça. Lira, no entanto, era mais rápida do que ele jamais poderia ter imaginado. Ela se esquivou por muito pouco, sentindo o vento da lâmina varrer seus cabelos ruivos. Com um movimento fluido, ela impulsionou a perna, golpeando Kael com um chute que o fez cambalear para trás, ganhando o espaço vital entre eles.
"Ka... Kael..." Lira tentou novamente, a voz rouca, quase um lamento, mas a sede e a fúria tornavam as palavras quase impossíveis de formar.
Os olhos azuis penetrantes de Kael, agora marejados, fixaram-se nela, não com ódio, mas com uma tristeza abissal. Lágrimas escorriam livremente por seu rosto marcado pela sujeira e cansaço. "Lira... Eu sinto muito", ele disse, a voz embargada pela culpa. "Se eu não tivesse demorado demais... acho que isso poderia ter sido evitado." O lamento em sua voz era palpável, a dor de uma promessa quebrada, de um mundo perdido, e de uma amiga transformada em algo irreconhecível.
Kael avançou novamente, não com a hesitação de antes, mas com a ferocidade de um cavaleiro treinado para a caça. Seus olhos azuis estavam fixos em Lira, a dor misturada a uma resolução gélida. Lira conseguiu desviar do golpe da espada por pouco, a lâmina de aço élfico sibilando no ar onde sua cabeça estivera momentos antes. Mas Kael era mais do que força; ele era estratégia. Desferiu uma ombrada poderosa que atingiu Lira em cheio, fazendo-a perder o equilíbrio e cambalear.
Um perigo diferente, gélido e ancestral, irradiou de Kael. Não era apenas a ameaça da espada, mas algo mais profundo, algo que Lira, em sua nova condição, podia sentir de forma visceral. Os olhos de Kael ardiam com uma determinação implacável. Então, o tormento chegou para a ruiva. De sua cintura, Kael puxou uma cruz de prata, simples, mas imbuída de um poder que Lira sentiu até os ossos. Ele a ergueu, e sua voz retumbou com uma oração poderosa:
"Que a luz santa a queime, criatura das trevas!"
A cruz de prata brilhou com uma intensidade cegante, um fulgor dourado e puro que se chocou contra a essência vampírica de Lira. Uma dor excruciante irrompeu dentro dela, como se seu corpo estivesse sendo consumido por chamas invisíveis. Era o fogo sagrado contra a profanação, e Lira sentiu cada fibra de seu novo ser arder.
A agonia a dominou, mas um instinto de sobrevivência, selvagem e primário, tomou conta. Antes que Kael pudesse aproveitar sua deixa, antes que a luz pudesse desintegrá-la, Lira, mesmo com a dor lancinante, chutou uma nuvem de terra e detritos nos olhos do cavaleiro. O ataque repentino o cegou por um instante crucial. Lira aproveitou a chance, virando-se e correndo em disparada para a escuridão da floresta, uma sombra vermelha em agonia, desaparecendo entre as árvores enquanto os gritos de dor e a luz da cruz a perseguiam.
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