Mariana
Alessandro
Capítulo 1
A campainha estridente da lanchonete "Madrugada Feliz" cortava o manto de silêncio que envolvia a rua deserta, um som metálico e insistente que, para Mariana, soava quase como um despertador para mais uma jornada noturna. Aos vinte anos, sua vida era um delicado equilíbrio entre a ambição que a impulsionava e a exaustão que a acompanhava. As manhãs eram dedicadas à absorção de conhecimentos nos corredores da faculdade de Arquitetura, onde plantas baixas e modelos tridimensionais ganhavam vida sob seus dedos habilidosos. Ela sonhava em moldar o espaço, em transformar ideias abstratas em estruturas concretas que pudessem abrigar sonhos e histórias, deixando sua marca no tecido da cidade. As noites, por outro lado, a ancoravam firmemente na realidade imediata da "Madrugada Feliz", um oásis de luz e calor em meio à escuridão, onde o aroma forte de café se misturava ao cheiro de hambúrgueres grelhando e à conversa incessante dos clientes noturnos.
Mariana movia-se com uma eficiência quase coreográfica atrás do balcão, seus gestos precisos e rápidos, fruto de incontáveis horas de prática. Seus dedos finos limpavam as manchas pegajosas de refrigerante com um pano úmido, enquanto sua mente, incansável, já esboçava mentalmente a fachada de um futuro projeto: um centro cultural vibrante, com linhas arrojadas e espaços que convidassem à interação. Ela possuía uma beleza natural, despretensiosa, que se manifestava em seus traços delicados e na luminosidade de seus olhos castanhos, sempre faiscando com uma determinação silenciosa. Seus longos cabelos castanhos, geralmente presos em um rabo de cavalo alto para não atrapalhar o trabalho, emolduravam um rosto jovem, mas marcado por uma seriedade que ia além de sua idade, uma maturidade adquirida nas longas horas de estudo e nas responsabilidades que ela carregava com uma firmeza admirável.
A "Madrugada Feliz" era um microcosmo da vida noturna da cidade. Mariana conhecia seus frequentadores habituais: os motoristas de caminhão, com seus rostos cansados e histórias de longas estradas, buscando um último estímulo antes de seguir viagem; os estudantes universitários, com seus olhos semicerrados pelo sono e suas mentes ainda fervilhando com as últimas aulas, em busca de um lanche rápido e reconfortante; os casais apaixonados, aproveitando a tranquilidade da noite para compartilhar confidências e sorrisos; e até mesmo aquelas figuras solitárias, envoltas em um ar de mistério e melancolia, cujos olhares carregavam o peso de segredos inconfessáveis. Mariana os atendia a todos com a mesma gentileza atenciosa, oferecendo um sorriso genuíno que parecia brotar de uma fonte inesgotável de otimismo, uma ilha de cordialidade em meio à agitação da noite. Ela apreciava as conversas breves, as trocas de gentilezas, sentindo-se de alguma forma conectada àquela comunidade efêmera que se formava a cada noite sob as luzes fluorescentes da lanchonete.
Naquela noite específica, uma atmosfera úmida e fria pairava sobre a cidade, resultado da garoa persistente que teimava em cair, transformando o asfalto em um espelho bruxuleante sob a luz dos postes. Mariana preparava um sanduíche especial, seguindo a receita de cabeça com uma precisão intuitiva, quando a porta da lanchonete se abriu novamente, permitindo que uma lufada de ar gelado invadisse o ambiente acolhedor, trazendo consigo uma presença que parecia destoar de tudo ali.
O homem que acabara de entrar era diferente de qualquer um que Mariana já tivesse visto cruzar aquela soleira. Sua estatura alta e esguia era composta por um sobretudo de lã escura, um tecido elegante que parecia absorver a pouca luz do local, conferindo-lhe uma aura sombria e sofisticada. Seus cabelos negros, cortados e penteados com uma precisão quase militar, brilhavam discretamente sob a luz amarelada das lâmpadas fluorescentes. Mas eram seus olhos que realmente prendiam a atenção: um azul glacial, límpido e penetrante, que parecia analisar cada detalhe do ambiente com uma intensidade fria e calculista. Havia algo em sua postura ereta, na maneira como ele se movia com uma calma estudada, que emanava uma aura de poder silencioso e uma autoridade inquestionável.
Alessandro Moretti. Aquele era um nome que ecoava como um trovão abafado em certos círculos da cidade, um nome carregado de um respeito forçado e de uma reputação construída sobre decisões implacáveis e uma frieza cortante. Ele havia chegado havia pouco tempo, enviado pela cúpula da poderosa máfia italiana com a missão de expandir seus negócios ilícitos em um novo território, tecendo uma teia de influência e controle nas sombras da metrópole. Acostumado a ser recebido com deferência e até mesmo temor, seus passos ecoavam em salões opulentos adornados com lustres de cristal, e seus comandos eram obedecidos sem a menor hesitação por homens que temiam mais a sua desaprovação do que qualquer lei. O mundo de Alessandro era um labirinto de reuniões secretas em escritórios luxuosos, acordos selados com um aperto de mão que carregava o peso de juramentos silenciosos, e a sombra constante da violência espreitando nos bastidores, pronta para ser desencadeada a qualquer momento.
Naquela noite, um súbito ataque de insônia o havia desviado de sua rotina habitual. O sono se recusava a abraçá-lo, e uma necessidade quase física por um café forte e amargo o guiara pelas ruas desertas até encontrar a luz acolhedora da "Madrugada Feliz", um farol solitário na escuridão da noite. Ele observou Mariana trabalhar por um instante, parado na porta, analisando a maneira como ela se movia com uma eficiência discreta e uma dedicação silenciosa, a forma como respondia aos outros clientes com uma gentileza despretensiosa que parecia genuína. Era uma cena tão distante da opulência e da artificialidade que permeavam seu cotidiano, tão desprovida da falsidade e do interesse calculista que invariavelmente o cercavam, que despertou nele uma curiosidade incomum, uma fagulha de algo que ele não conseguia identificar imediatamente.
Quando seus olhos se encontraram brevemente com os de Mariana, enquanto ela entregava um prato fumegante a um cliente sorridente, Alessandro sentiu uma sensação estranha, quase um choque elétrico sutil que percorreu seu corpo. Ela o encarou com uma naturalidade surpreendente, sem o brilho de reconhecimento ou o véu de medo que ele estava acostumado a ver nos olhos daqueles que sabiam quem ele era. Para ela, naquele momento, ele era apenas mais um cliente anônimo, um rosto desconhecido surgindo na quietude da noite. Essa indiferença o intrigou profundamente, despertando nele uma sensação há muito adormecida. Em seu mundo, um olhar tão desprovido de segundas intenções era uma raridade, quase uma anomalia.
Ele finalmente se moveu, caminhando com passos lentos e silenciosos até um dos poucos bancos de couro vermelho que estavam vagos junto ao balcão. Sentou-se com uma compostura elegante, observando Mariana enquanto ela se aproximava para atendê-lo, seu rosto iluminado pela luz suave que emanava do cardápio luminoso pendurado acima. "Boa noite. O que vai desejar?", perguntou Mariana, sua voz suave e ligeiramente rouca, talvez pelo cansaço acumulado da noite, mas ainda assim carregada de uma cordialidade genuína.
Alessandro hesitou por um breve instante, seus olhos azuis fixos nos dela, como se estivesse ponderando algo muito além do que estava escrito no cardápio plastificado. "Um café preto, por favor", respondeu finalmente, sua voz grave e rouca, com um leve sotaque italiano que Mariana achou charmoso, embora não soubesse identificar sua origem. "Forte."
Enquanto Mariana se virava para preparar sua bebida, o silêncio que se instalou entre eles era diferente do silêncio tenso e carregado que Alessandro geralmente impunha em seus encontros. Havia ali uma ausência de expectativas, uma bolha de normalidade em meio à sua existência turbulenta e perigosa. Ele a observou enquanto ela manuseava a máquina de café com uma destreza profissional, o vapor quente subindo em espirais brancas e se dissipando no ar com um sussurro suave. Por um breve e fugaz momento, Alessandro Moretti, o temido chefe da máfia italiana, se permitiu apenas ser um homem comum em uma lanchonete simples, observando uma jovem trabalhadora em meio à quietude da noite, alheio ao turbilhão de eventos que o destino já estava tecendo ao seu redor. Mal sabia ele que aquele encontro aparentemente casual plantaria uma semente que germinaria em um futuro incerto e perigoso, entrelaçando seus destinos de maneiras que nenhum dos dois poderia jamais prever. Naquele instante, para ele, ela era apenas uma estranha. Mas o destino, com sua ironia cruel e seus desígnios misteriosos, já havia começado a traçar um caminho sinuoso e imprevisível que os uniria de forma inesperada e dolorosa, alterando para sempre o curso de suas vidas.
Capítulo 2
Os dias que se seguiram àquela noite na lanchonete deslizaram para Mariana em uma rotina familiar, marcada pelo aroma constante de café e pela pressa dos clientes noturnos. Alessandro Moretti não retornou, e a breve sensação de estranheza que sua presença causara dissipou-se gradualmente, soterrada pelas exigências do trabalho e pelos prazos da faculdade. Mariana continuava a perseguir seus sonhos com a mesma obstinação, dividindo-se entre as aulas de desenho técnico e as madrugadas na "Madrugada Feliz", economizando cada centavo com a esperança de, um dia, poder se dedicar integralmente à arquitetura e construir um futuro mais promissor para si e para seus pais adotivos.
A vida em sua casa era simples, marcada pela rotina e por um afeto silencioso. Seus pais, Ana e João, eram pessoas trabalhadoras e honestas, que a haviam acolhido com amor e dedicação desde que ela era um bebê. Ana, com suas mãos calejadas pelo trabalho na pequena floricultura que mantinham, era a personificação da doçura e da preocupação. João, um homem de poucas palavras e muitos gestos, demonstrava seu carinho através de pequenos favores e de um olhar protetor. Mariana era grata pela família que a vida lhe havia dado, mesmo carregando consigo a vaga lembrança de um passado nebuloso, de rostos desconhecidos e de uma sensação persistente de não pertencer totalmente àquele lar.
No entanto, uma sombra pairava sobre a serenidade daquele cotidiano modesto. João, um homem de bom coração, mas com uma fragilidade perigosa, havia sucumbido ao vício do jogo. O que começara como uma distração inofensiva transformara-se em uma compulsão destrutiva, engolindo suas economias e o mergulhando em um mar crescente de dívidas. Ana tentava, em vão, dissuadi-lo, suas palavras de preocupação ecoando em meio às discussões silenciosas e ao clima tenso que se instalara na pequena casa. Mariana percebia a angústia nos olhos de sua mãe, as noites mal dormidas e o cansaço estampado em seu rosto, mas sentia-se impotente diante daquela situação que parecia fugir ao seu controle.
As dívidas de João se avolumavam como uma avalanche silenciosa, e os cobradores, figuras sombrias e ameaçadoras, começaram a rondar a casa, trazendo consigo um medo palpável. Mariana presenciava as discussões ásperas entre seu pai e aqueles homens, o tom de voz cada vez mais elevado, as promessas vazias e o desespero crescente no olhar de João. Ela tentava intervir, oferecer suas economias, mas a quantia que conseguira juntar era insignificante diante do montante assustador que ele devia.
Em uma noite particularmente sombria, após mais uma discussão acalorada com um cobrador de aparência sinistra, João desapareceu. Ana e Mariana passaram horas angustiantes, ligando para hospitais e delegacias, temendo o pior. Ele retornou na manhã seguinte, com o rosto pálido e os olhos fundos, carregando consigo um peso ainda maior. A verdade que ele finalmente confessou era ainda mais aterradora do que seus piores pesadelos.
Em um ato de desespero covarde, impulsionado pelo vício e pela pressão dos credores, João havia feito um acordo impensável. Em troca do perdão de uma parte de suas dívidas, ele havia oferecido Mariana como pagamento a um dos seus credores, um homem ligado a uma organização criminosa perigosa. Ele havia feito isso sem o consentimento de Mariana, sem sequer consultar Ana, em um ato de traição que rasgaria para sempre o tecido daquela família.
A notícia atingiu Mariana como um golpe físico. A incredulidade inicial rapidamente se transformou em choque, raiva e um medo paralisante. Como seu próprio pai poderia fazer algo tão monstruoso? Como ele poderia oferecê-la como se ela fosse uma mercadoria, um objeto a ser trocado por dinheiro? A confiança que ela depositava nele, mesmo com suas falhas, desmoronou como um castelo de areia atingido pela fúria do mar.
Ana reagiu com uma mistura de horror e desespero. Suas lágrimas silenciosas eram mais eloquentes do que qualquer grito, e seu olhar fixo em João expressava uma dor profunda e uma incredulidade amarga. O lar que antes era um refúgio de paz e amor transformou-se em um palco de acusações silenciosas e de um sofrimento lancinante.
Mariana sentia-se violada, não apenas pelo ato hediondo de seu pai, mas também pela sensação de ter seu futuro roubado, seus sonhos esmagados sob o peso da dívida e da traição. A vida honesta que ela tanto almejava, construída com sacrifício e esperança, parecia agora uma miragem distante, inatingível. Ela estava presa em uma teia sombria, vítima da fragilidade de um homem e da crueldade de um mundo que ela nunca imaginou que pudesse alcançá-la.
Naquela noite fatídica, homens de aparência rude e olhar frio chegaram à casa. A atmosfera estava carregada de tensão, o silêncio era opressor. João mal conseguia encará-la, seu rosto contorcido em uma máscara de vergonha e medo. Ana agarrava a mão de Mariana com força, seus dedos trêmulos transmitindo seu terror. Mariana, apesar do turbilhão de emoções que a assolava, tentava manter a compostura, buscando em seu interior uma força que ela sequer sabia que possuía.
Ela foi levada daquele lar que, apesar das dificuldades, sempre fora seu porto seguro. No carro que a transportava para um destino incerto, suas lágrimas finalmente rolaram, silenciosas e amargas. A paisagem noturna passava como um borrão indistinto, enquanto sua mente tentava processar a brutalidade da sua nova realidade. Ela estava sendo entregue como um pagamento, como um objeto sem valor, a um mundo de sombras e perigo que ela jamais quisera conhecer.
O carro parou em frente a uma mansão imponente, cercada por muros altos e com seguranças armados por toda parte. O portão de ferro forjado se abriu lentamente, revelando um caminho iluminado que levava a uma porta maciça. O medo que Mariana sentia era avassalador, mas em meio ao terror, uma centelha de rebeldia começava a acender em seu coração. Ela não seria uma vítima passiva. Ela lutaria por sua dignidade, por sua liberdade, mesmo que as chances parecessem mínimas.
Ao ser conduzida para o interior da mansão, Mariana encontrou-se diante de Alessandro Moretti. Ele estava ainda mais imponente e enigmático do que ela se lembrava daquela noite na lanchonete. Seus olhos azuis a fitaram com uma intensidade fria, avaliando-a de cima a baixo. Naquele momento, Mariana era apenas o pagamento de uma dívida, uma moeda de troca em um jogo perigoso. Mas o destino, mais uma vez, reservava surpresas. Algo na fragilidade aparente e na altivez silenciosa de Mariana pareceu despertar algo inesperado em Alessandro. Em vez de tratá-la como um objeto, como ele provavelmente faria com qualquer outra "mercadoria", ele proferiu uma ordem surpreendente, uma decisão que mudaria o curso da vida de ambos: "Ela ficará sob minha proteção."
As palavras de Alessandro ecoaram no salão luxuoso, quebrando a tensão palpável. Os homens que a haviam trazido trocaram olhares confusos, acostumados à brutalidade e à objetividade de seu chefe. Aquele gesto inesperado era um desvio perigoso das regras do seu mundo. Para Mariana, aquelas palavras foram um raio de esperança em meio à escuridão, uma promessa tênue de que talvez, apenas talvez, ela não estivesse completamente sozinha naquele inferno. O preço de sua inocência havia sido alto, mas o seu calvário estava apenas começando, e o caminho à frente era incerto e perigoso, pavimentado com segredos, intrigas e a sombra constante da máfia.
Capítulo 3
A decisão de Alessandro reverberou pelo imponente salão, silenciando os sussurros e os olhares curiosos dos homens que haviam trazido Mariana. Para eles, a jovem de semblante frágil e olhar assustado era apenas mais um ativo, uma forma de quitar uma dívida incômoda. A ideia de que o chefe da máfia italiana a acolheria sob sua proteção era algo inédito, uma anomalia que desafiava a lógica fria e transacional do seu mundo.
Mariana, por sua vez, sentiu um fio tênue de esperança se enroscar em seu coração. A proteção de um homem como Alessandro, por mais enigmático e perigoso que ele parecesse, era preferível à incerteza sombria que a aguardava. Seus olhos encontraram os dele por um breve instante, buscando decifrar a motivação por trás daquela decisão inesperada, mas a frieza impenetrável em seu olhar não revelava nada.
Os dias que se seguiram à sua chegada à mansão foram estranhos e desorientadores. Mariana foi instalada em um quarto luxuoso, com móveis de madeira escura e pesadas cortinas de veludo que bloqueavam a luz do sol. Era uma prisão dourada, onde suas necessidades básicas eram atendidas por empregados silenciosos e solícitos, mas onde a liberdade era uma miragem distante. Ela passava as horas explorando os livros na estante, tentando se distrair da angústia e da incerteza que a consumiam. A ausência de notícias de Ana e a culpa paralisante em relação ao ato de seu pai eram um fardo pesado demais para suportar sozinha.
Alessandro era uma figura esquiva em sua nova realidade. Ele aparecia esporadicamente, geralmente à noite, seus encontros breves e formais. Ele a observava com um olhar distante, como se estivesse avaliando algo além de sua presença física. Suas palavras eram poucas, geralmente ordens concisas aos seus subordinados em relação ao bem-estar de Mariana, mas sem dirigir-se diretamente a ela de forma pessoal.
Em meio a essa atmosfera de tensão silenciosa, Mariana começou a perceber a dinâmica complexa que regia a mansão. Homens armados circulavam pelos corredores com uma discrição ameaçadora, sussurros em italiano ecoavam pelas paredes e reuniões privadas aconteciam em salas fechadas, exalando um ar de segredo e poder. Ela estava imersa em um mundo que sempre vira de longe, nos filmes e nos noticiários, mas que agora a engolia com sua brutalidade fria e calculista.
Uma noite, um dos empregados a informou que Alessandro desejava vê-la na biblioteca. Mariana sentiu um calafrio percorrer sua espinha. Era o primeiro contato real desde sua chegada, e ela não sabia o que esperar. Ao entrar na biblioteca, um vasto salão com estantes que se perdiam de vista e um cheiro inebriante de livros antigos, encontrou Alessandro parado junto à janela, observando a escuridão lá fora.
"Prepare-se", disse ele, sem se virar. "Esta noite, você irá a um evento."
Mariana sentiu o coração acelerar. "Que tipo de evento?"
"Um baile", respondeu ele, finalmente se voltando para encará-la. Seus olhos azuis eram frios e diretos. "Um baile onde negócios são feitos e alianças são formadas. Você estará comigo."
O medo e a confusão se misturaram em Mariana. Ela não entendia por que Alessandro a levaria a um evento daquele tipo. Ela era apenas uma prisioneira, o pagamento de uma dívida. Qual seria o seu papel naquele mundo de poder e intriga?
"Eu não tenho roupas adequadas", murmurou ela, sentindo-se deslocada e vulnerável.
Um leve sorriso, frio e quase imperceptível, curvou os lábios de Alessandro. "Isso não será um problema."
Naquela noite, Mariana foi apresentada a um mundo de opulência e perigo que excedia sua imaginação mais sombria. Foi levada a um salão de festas deslumbrante, adornado com lustres de cristal, tapeçarias suntuosas e uma orquestra que tocava melodias suaves, contrastando ironicamente com a atmosfera tensa que pairava no ar. A elite do submundo estava ali reunida: homens e mulheres elegantemente vestidos, ostentando joias caras e sorrisos calculados, seus olhares carregados de segredos e ambições.
Alessandro a conduziu pelo salão com uma mão firme em sua cintura, sua presença imponente abrindo caminho entre a multidão. Mariana sentia os olhares curiosos e avaliadores sobre ela, sussurros que a seguiam como sombras. Ela se sentia como uma estranha em um planeta desconhecido, tentando decifrar os códigos silenciosos e as dinâmicas de poder daquele universo.
Foi então que ela a viu. Uma senhora idosa, sentada em um trono improvisado em um canto do salão, cercada por um séquito de homens que a tratavam com uma reverência quase religiosa. Seu rosto era marcado por rugas profundas que contavam histórias de poder e crueldade, e seus olhos escuros observavam tudo com uma intensidade feroz. Ela usava um vestido preto elegante e ostentava anéis de ouro maciço em cada dedo. Era uma figura imponente, que emanava uma aura de autoridade inquestionável.
Quando os olhos da senhora se fixaram em Mariana, a jovem sentiu um arrepio percorrer sua espinha. Havia um misto de desprezo e curiosidade naquele olhar, como se ela fosse um inseto sendo examinado sob uma lente de aumento. Alessandro se aproximou da senhora, curvando-se levemente em um gesto de respeito.
"Donatella", disse ele, sua voz carregada de um tom formal. "Permita-me apresentar Mariana."
A velha senhora avaliou Mariana de cima a baixo, seu olhar demorado e inquisitivo. "Mais uma das suas acompanhantes, Alessandro?", perguntou ela, sua voz rouca e carregada de um sotaque forte. Havia um tom de escárnio na sua pergunta, como se Mariana fosse apenas mais um troféu descartável.
Mariana sentiu o rosto corar de humilhação. Ela não era uma acompanhante, não estava ali por vontade própria. Mas sabia que naquele mundo, sua voz não tinha peso algum.
Alessandro manteve a compostura. "Mariana está sob minha proteção, Donatella. As circunstâncias de sua presença aqui são... diferentes."
Donatella ergueu uma sobrancelha fina, seu olhar ainda fixo em Mariana. "Diferentes, é? Todos os seus casos são 'diferentes', Alessandro. Mas no final, todos eles desaparecem."
O comentário ácido atingiu Mariana como uma flecha. Ela percebeu o desprezo daquela mulher poderosa, a forma como ela a via como insignificante e passageira. Mas em vez de se encolher, algo dentro dela se acendeu. Uma faísca de orgulho ferido, uma recusa silenciosa em ser definida pelas circunstâncias.
Naquela noite, Mariana aprendeu algumas lições cruéis sobre o mundo em que havia sido jogada. Ela percebeu que a opulência escondia uma brutalidade fria, que os sorrisos eram máscaras para ambições sombrias e que o poder era exercido sem escrúpulos. Ela era uma estranha naquele baile de serpentes, uma figura deslocada entre o brilho do ouro e a escuridão das sombras. Mas, sob o olhar avaliador de Donatella e a proteção enigmática de Alessandro, uma nova determinação começava a germinar em seu coração. Ela sobreviveria. Ela descobriria o seu lugar naquele mundo perigoso, mesmo que isso significasse desenterrar segredos obscuros e enfrentar inimigos poderosos. Mal sabia ela que aquela velha senhora, com seu olhar penetrante e suas palavras venenosas, guardava a chave para o seu passado esquecido, um passado que a ligava de forma inesperada à própria essência daquele submundo.
Para mais, baixe o APP de MangaToon!