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A BELA E A FERA ( nos Braços do Mafioso)

Capítulo 1 – O Sonho Que Virou Pesadelo

O vento soprava forte naquela tarde em que Isabella deixou sua pequena cidade rumo a São Paulo. O coração batia acelerado no peito, misturado entre medo e euforia. Aos vinte e dois anos, finalmente estava indo atrás do sonho que alimentava desde criança: ser modelo. Sempre ouvira que tinha beleza rara, traços delicados, e um brilho no olhar que chamava atenção. Era sua chance.

Foi Márcia, uma mulher elegante que apareceu em sua cidade com promessas de agenciamento, que lhe abriu a porta para esse "mundo mágico". “Você tem um perfil internacional”, dissera. “Comigo, sua carreira decola.” Isabella, ingênua, acreditou. Mal sabia que estava caminhando direto para a armadilha.

A rodoviária era barulhenta e agitada. Isabella carregava apenas uma mala simples, recheada de esperanças e algumas poucas roupas. Ao desembarcar, foi recebida por um homem alto, de óculos escuros e cara fechada. Ele se apresentou como Rubens, assistente de Márcia. Sem muita conversa, colocou a mala no porta-malas do carro e pediu que ela entrasse.

— Márcia está esperando você no apartamento onde vai ficar hospedada — disse, seco.

Durante o trajeto, Isabella tentou puxar assunto, mas Rubens limitava-se a respostas monossilábicas. A cidade parecia enorme demais, barulhenta demais, cheia de rostos apressados e frios. O contraste com sua cidadezinha era assustador, mas ela não queria se deixar abater. “É só o começo”, pensou.

Quando o carro parou diante de um prédio antigo e escuro, no bairro da Mooca, Isabella franziu o cenho. Aquilo não parecia nem de longe um local de hospedagem para modelos. Desceu hesitante.

— Márcia está lá dentro. Sobe — indicou Rubens, apontando para o portão de ferro.

No segundo andar, a porta já estava entreaberta. Isabella bateu, sem resposta. Entrou devagar.

O cheiro forte de cigarro e álcool a fez recuar. O apartamento estava escuro, mal iluminado, com móveis velhos e desorganizados. Em vez de Márcia, quem a esperava era outro homem — muito mais imponente, de expressão dura e olhos penetrantes.

— Quem... quem é o senhor? — gaguejou.

— Nério Belchior — respondeu ele, cruzando os braços. — Você é a Isabella?

— Sou. Mas... onde está Márcia?

O sorriso dele foi seco, quase debochado.

— Márcia cumpriu sua parte. Agora você é minha.

A frase soou como um tiro. Isabella arregalou os olhos, confusa.

— Como assim?

— Fui claro. Você foi vendida, garota. Márcia é apenas uma intermediária. Bem-vinda ao seu novo mundo.

O choque foi tão grande que Isabella perdeu o chão. Suas pernas tremiam. Tentou recuar, correr para a porta, mas dois homens surgiram do nada, bloqueando sua saída.

— Vocês estão loucos! Isso é sequestro! — gritou, a voz embargada pelo desespero.

Nério aproximou-se, impassível. Ele tinha uma presença intimidadora. A cicatriz discreta na sobrancelha esquerda e o olhar sombrio davam a ele um ar perigoso. Era como encarar uma fera.

— Você não faz ideia de onde se meteu, mocinha. Gritar não vai te ajudar.

Isabella sentiu as lágrimas escorrerem pelo rosto. O sonho de ser modelo se desfazia como areia entre os dedos. Tudo era uma mentira. Estava presa. Vendida.

— Por que... por que está fazendo isso comigo?

— Porque eu posso — respondeu ele, virando-se para sair. — Descansa. Amanhã começa sua nova vida.

A porta se fechou com um estrondo, e o som das trancas sendo passadas foi como o selar de um destino cruel. Sozinha no quarto escuro, Isabella caiu de joelhos, sufocada pelo medo. O apartamento parecia uma prisão, mas mais aterrador era o fato de que sua liberdade fora arrancada sem qualquer aviso.

E no meio de toda aquela escuridão, uma certeza queimava em seu peito: ela não se renderia tão fácil.

Isabella ficou ali, caída no chão frio, por tempo indeterminado. A mente rodava em círculos, tentando encontrar alguma explicação lógica para o que acabara de acontecer. “Talvez seja um teste”, tentou acreditar. “Um tipo de pegadinha cruel para ver se eu aguento pressão.” Mas no fundo, ela sabia: aquilo era real.

Com esforço, levantou-se e olhou ao redor. O quarto onde fora deixada tinha paredes sujas, uma cama de solteiro com lençóis encardidos e uma janela gradeada. Não havia armário, apenas uma cômoda quebrada e um espelho rachado. Seu reflexo parecia de outra pessoa — assustada, desfigurada pela dor.

Tateando os cantos do cômodo, ela tentou encontrar alguma saída, alguma fresta de liberdade. Nada. Só paredes e grades. A porta estava trancada por fora.

As horas passaram lentamente. Quando finalmente a maçaneta girou novamente, Isabella recuou instintivamente. A porta se abriu, revelando uma mulher de meia-idade, cabelos presos num coque apertado e expressão dura. Carregava uma bandeja.

— Coma — ordenou, deixando a comida sobre a cômoda. — E tome um banho. Você tem uma entrevista amanhã.

— Entrevista? — Isabella murmurou, confusa. — Eu não vou trabalhar para ele! Quero ir embora!

A mulher a encarou por um momento.

— Não seja tola. Aqui, ou você se adapta... ou se perde.

Sem dizer mais nada, a mulher saiu e trancou a porta novamente.

Isabella se aproximou da comida, mas o estômago embrulhado recusava qualquer mordida. Sentia-se violada, traída, jogada num pesadelo que parecia não ter fim. Mesmo assim, decidiu tomar um banho. Precisava pensar com clareza, precisava manter a sanidade.

No chuveiro, a água era gelada e o encanamento fazia barulhos estranhos. Ainda assim, ela deixou que a água escorresse por seu corpo como uma tentativa de lavar a dor. A cada gota, lembrava-se de casa — de sua mãe, da avó, das noites olhando as estrelas, sonhando com passarelas e holofotes.

“Eu preciso sair daqui. Eu preciso voltar pra casa.”

Naquela noite, não dormiu. O colchão era duro, o travesseiro cheirava mofo, e os pensamentos eram torturantes. Em algum momento, ouviu passos no corredor e vozes abafadas. Uma delas era de Nério. Ela reconheceu o timbre autoritário, as ordens curtas, os silêncios entre as frases. Havia algo de perigoso, mas... também intrigante.

Na manhã seguinte, a mesma mulher voltou com roupas. Um vestido preto colado, salto alto, maquiagem forte. Isabella hesitou.

— Eu não vou vestir isso.

— Vai sim — a mulher respondeu. — Nério quer que você esteja apresentável. Hoje você vai aprender a sorrir mesmo com o coração sangrando.

Isabella mordeu o lábio, as mãos tremendo. No fundo, sabia que não adiantava resistir à força. Precisava ser esperta, estratégica. Se fingisse submissão, talvez ganhasse tempo para escapar.

Vestiu-se com nojo de si mesma, mas ergueu o queixo. Havia fogo nos olhos, mesmo por trás das lágrimas secas.

Pouco depois, foi conduzida por um dos capangas até uma sala ampla no andar de baixo. Era luxuosa, com móveis caros, decoração sombria e um forte cheiro de charuto. Nério estava ali, sentado à cabeceira de uma grande mesa, observando-a.

— Bela — disse ele, com ironia. — Sente-se.

Ela não respondeu. Sentou-se, mantendo o máximo de distância possível.

— Hoje você vai acompanhar Marta a um evento. Quero que observe, aprenda. Em breve, será você quem estará sorrindo para meus parceiros.

— Eu não sou um objeto — retrucou, com a voz firme.

Ele arqueou uma sobrancelha.

— Mas está sob minha posse. Não se esqueça disso.

O sangue de Isabella ferveu. Teve vontade de gritar, de bater, de quebrar tudo. Mas conteve-se. Sua mente sussurrava: “Calma. Respira. Finja.”

O dia foi longo. Marta, a mulher dura que a alimentara, revelou-se uma espécie de “instrutora”. Mostrou-lhe como andar, como sorrir, o que dizer. Isabella absorvia tudo com olhar atento, mas por dentro arquitetava sua fuga.

A noite chegou rápida, e com ela, a primeira saída. Em um carro preto, Isabella foi levada a um evento em um restaurante de luxo. Ali, homens ricos, olhares famintos, e sorrisos falsos se misturavam ao som do jazz.

Isabella tentou parecer indiferente, mas seu coração disparava a cada passo. Entre as taças de vinho e os risos forçados, seus olhos buscaram uma saída. Uma brecha. Um rosto que parecesse confiável.

E então, ela viu.

No canto do salão, um homem de expressão serena, olhar atento. Ele a encarava como se enxergasse além da maquiagem, além do vestido. Como se a visse de verdade.

Isabella desviou o olhar. Mas algo dentro dela despertou.

Ela ainda não sabia, mas aquele olhar marcaria o começo de uma reviravolta inesperada.

O jogo estava apenas começando.

Capítulo 2 A promessa do silêncio

O salão era repleto de luzes e sorrisos ensaiados. Um perfume doce e enjoativo pairava no ar, misturado ao cheiro de dinheiro e poder. Isabella sentia-se fora de lugar, como se estivesse vestindo uma fantasia que não lhe pertencia. O vestido preto colado ao corpo e o salto alto faziam-na parecer confiante, mas por dentro, cada passo era como caminhar sobre cacos de vidro.

Ela observava tudo com olhos atentos. Cada rosto, cada gesto. Sabia que estava sendo testada. Nério não faria tudo aquilo à toa. Ele a expunha de propósito, como se quisesse moldá-la diante daqueles homens. O olhar dele, distante e calculista, a observava de longe — como um domador examinando uma fera prestes a ser domada.

Mas Isabella não era fácil de quebrar.

No canto do salão, o homem de olhar sereno ainda a observava. Seus olhos não a despiam como os outros. Havia algo de diferente neles. Algo inquietante, mas ao mesmo tempo... seguro. Ela desviou o olhar, tentando não chamar atenção. Não podia confiar em ninguém. E ainda assim, aquele estranho fez seu coração bater num compasso diferente.

Marta, sempre firme e direta, a conduzia de um grupo a outro, apresentando Isabella como "a nova aquisição de Nério". As palavras eram ditas com naturalidade, como se ela fosse um objeto caro em exposição. Isabella sorria, apertava mãos, fingia. Aprendeu rapidamente o jogo da aparência.

— Mantenha o sorriso. Sempre — sussurrou Marta, apertando-lhe o braço.

Por dentro, Isabella gritava.

Horas se passaram até que ela foi levada para uma área mais reservada, uma varanda envidraçada com vista para o skyline da cidade. A noite estava clara, e o brilho da cidade a fazia lembrar de tudo que perdera: liberdade, inocência, segurança.

Ela se encostou na grade, respirando fundo. Precisava manter a mente firme. Não era hora para desespero. Ainda podia escapar. Precisava apenas do momento certo.

— Não gosta de festas?

A voz a pegou de surpresa. Virou-se rapidamente. Era ele. O homem do olhar sereno.

— Não estou exatamente em uma festa — respondeu, seca, mas sem conseguir esconder a curiosidade.

— Entendo. — Ele deu um passo mais perto. — Não parece feliz em estar aqui.

— Por que diz isso?

— Porque sei reconhecer quando alguém está em silêncio por dentro. E você está gritando.

Isabella engoliu seco. Quem era ele?

— Me desculpe, mas eu não deveria estar conversando com você.

— Meu nome é Adriano — disse ele, estendendo a mão. — E você?

Ela hesitou por alguns segundos.

— Isabella.

— Um nome bonito para alguém que não sabe a força que carrega nos olhos.

Ela desviou o olhar, desconfiada.

— Você trabalha com Nério?

— Já trabalhei. Hoje... não mais. Mas continuo preso a este mundo, de certa forma.

— Então sabe quem ele é.

— Todos sabem.

O silêncio se instalou entre os dois. Isabella sentia algo diferente na presença dele. Era como se, por alguns segundos, ela não estivesse em uma prisão, mas em algum lugar seguro.

— Você quer fugir, não quer? — ele perguntou, em voz baixa.

Ela arregalou os olhos.

— O que você está dizendo?

— Eu vi. Seus olhos estão procurando saídas desde que entrou. Você está procurando uma chance.

— E se estiver?

— Estou dizendo que... talvez eu possa te ajudar.

Ela recuou um passo, desconfiada.

— Por que faria isso?

— Porque eu já fui preso nesse mundo também. Já perdi alguém que amava por não agir a tempo.

Isabella o encarou, tentando ler a verdade em seus olhos. Ele parecia sincero. Parecia... real. Mas ela não podia se dar ao luxo de confiar.

Antes que pudesse responder, Marta surgiu, cortando o momento.

— Isabella! — chamou, com rispidez. — Está na hora de ir.

Isabella lançou um último olhar para Adriano. Ele apenas assentiu com um leve movimento de cabeça, como quem dizia: “nos vemos de novo”.

O caminho de volta foi silencioso. No carro, Nério a observava pelo retrovisor. Seu olhar era como uma lâmina afiada, cortando qualquer tentativa de esconder emoções.

— Se divertiu? — ele perguntou.

— Se é assim que você se diverte, então não — respondeu com coragem.

Ele sorriu de lado.

— Vai aprender. É questão de tempo.

— Você não pode me obrigar a ser o que eu não sou.

— Mas posso moldar você até esquecer quem era.

Isabella sentiu um calafrio percorrer a espinha. Nério não precisava gritar para ameaçar. Sua calma era mais cruel que qualquer fúria.

Ao chegarem no apartamento, Isabella foi direto para o quarto. Trancada novamente, sentou-se na cama com o coração acelerado. Adriano podia ser sua chance. Mas e se fosse uma armadilha? E se fosse apenas mais uma jogada de Nério?

Naquela madrugada, quase não dormiu. Em sua mente, planejava rotas de fuga, ensaiava diálogos, imaginava a vida do lado de fora. Precisava ser forte. Precisava resistir.

No dia seguinte, foi levada a uma reunião com outros “novos rostos” que Nério treinava. O ambiente era sufocante. Isabella ouvia histórias de outras garotas: algumas já haviam desistido de lutar, outras estavam quebradas demais para tentar.

Mas havia uma, chamada Lorena, que lhe chamou atenção. Uma moça de olhar firme, pele morena, cabelos cacheados até os ombros.

Durante um intervalo, Lorena se aproximou.

— Primeira vez? — perguntou, em tom baixo.

— Sim — respondeu Isabella, cautelosa.

— Vai querer fugir. Todas querem.

— E você?

— Já tentei. E quase morri. Eles sempre acham a gente. Sempre.

Isabella sentiu um nó na garganta.

— Então... o que faz aqui?

— Espero o momento certo. E quando chegar, não vou olhar pra trás.

A conversa foi interrompida por Rubens, que ordenou que voltassem. Mas aquele breve diálogo acendeu algo em Isabella. Ela não estava sozinha. Existiam outras como ela. E talvez... juntas, tivessem alguma chance.

Mais tarde, ao final do dia, Isabella foi surpreendida por um bilhete deixado discretamente entre as páginas de um livro em sua cômoda.

“Se ainda quiser sair, encontre-me amanhã às 23h, na garagem. Não conte a ninguém. – A”

O coração disparou. Adriano.

Ela sentiu o medo apertar o peito, mas também algo novo: esperança.

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Na noite seguinte, Isabella fingiu estar doente. Recusou o jantar, deitou-se cedo e esperou que tudo ficasse em silêncio. Quando o relógio marcou 22h45, ela se levantou devagar. O prédio estava quieto. Vestiu-se com roupas simples, prendeu o cabelo e pegou a única coisa de valor que ainda carregava: um pingente de sua avó.

Saiu sem fazer barulho, descendo pelas escadas de serviço. Cada degrau parecia um desafio. A qualquer momento, alguém poderia vê-la. Mas a coragem era maior que o medo.

Ao chegar na garagem, o coração quase saltou do peito. Estava escuro, com poucos carros estacionados. Por um instante, pensou que fosse uma armadilha.

Mas então, uma porta se abriu.

— Isabella — chamou Adriano, surgindo da sombra. — Vem comigo. Agora.

Ela correu até ele, sem pensar. Subiram em um carro comum, sem luxo. Ele acelerou, saindo do prédio sem chamar atenção. Isabella olhou pela janela, sentindo as lágrimas escorrerem.

Estava fugindo. Pela primeira vez, sentia-se viva novamente.

Mas ela não sabia que Nério já havia percebido sua ausência.

E que essa fuga... teria um preço alto demais.

Capítulo 3 Máscaras caindo

As luzes da cidade se apagavam atrás do carro preto que cruzava a estrada sinuosa. Isabella mantinha os olhos fixos na janela, o coração apertado. Adriano, antes seu porto seguro, agora era um estranho. Silencioso, frio. A sensação de alívio que sentira ao fugir da mansão de Nério evaporava a cada quilômetro.

— Adriano... pra onde estamos indo? — ela perguntou, tentando disfarçar o medo.

— Um lugar onde ele não vai te encontrar — respondeu seco, sem desviar os olhos da estrada.

— Ele quem?

— Nério. Você está longe de imaginar o tipo de homem que ele é.

Ela franziu a testa. Algo na voz dele não soava como preocupação. Era posse. Controle.

— E quem é você, Adriano? — arriscou, virando-se para ele.

Adriano deu um leve sorriso, mas seus olhos estavam frios.

— Alguém que sempre soube jogar melhor que Nério.

O carro parou numa chácara afastada, envolta por árvores e silêncio. O cenário era mais assustador que a mansão onde Isabella estivera presa. Adriano saiu e abriu a porta para ela.

— Desça.

— Eu quero saber o que está acontecendo! — ela recuou no banco.

— Nério precisava de uma noiva pra herdar a liderança da máfia. Uma mulher sem laços, sem poder, fácil de controlar. Você era perfeita.

— Como assim...? Você me tirou de lá pra me proteger. Não foi?

Adriano riu.

— Que doce ilusão. Eu te tirei de lá porque cansei de ser sombra. Se ele não casar com você, perde o trono. E eu assumo.

Isabella empalideceu. Tinha fugido de um cativeiro para cair em outro.

Antes que pudesse gritar, faróis cortaram a escuridão. Um carro preto surgiu. Nério saiu de dentro como uma tempestade, os olhos chamejando de ódio.

— Solta ela, Adriano!

Adriano puxou Isabella para junto de si e sacou uma arma.

— Um passo a mais, e ela morre!

— Covarde... — murmurou Nério. — Sempre foi.

— E você sempre foi o protegido! O queridinho da máfia brasileira! Só herdou o cargo porque nasceu com o sobrenome certo!

Nério cerrou os punhos, mas manteve a calma.

— Você tá jogando sujo.

— E você não? Vai me dizer que sequestrar uma moça inocente pra garantir um trono é justo?

Nério não respondeu. Seu olhar caiu sobre Isabella, que tremia nos braços do traidor.

— Eu nunca quis isso pra você — disse, baixo. — Nunca quis te arrastar pra esse mundo.

— E por que me escolheu? — perguntou ela, com a voz embargada.

Ele hesitou.

— Porque eu não podia ter quem eu realmente queria.

Silêncio.

— Cristina — completou, quase como uma confissão. — Ela é filha do Dom francês. Um amor proibido entre duas máfias rivais. Se eu me casasse com ela, daria início a uma guerra.

Isabella sentiu o peito apertar. Era só uma peça no tabuleiro. Um substituto.

— E eu? O que sou?

— Uma saída. Um acordo. Mas não imagine que isso me dá o direito de permitir que outro homem toque em você.

Num movimento rápido, Isabella mordeu o braço de Adriano e se soltou. Nério correu e a puxou para trás de si, enquanto os dois homens lutavam. A arma caiu. Nério foi mais ágil. Dominou Adriano no chão e sussurrou:

— Você cavou sua própria cova.

Minutos depois, seguranças armados chegaram. Adriano foi rendido e levado, gritando.

— Isso não vai ficar assim, Nério! Um dia vão ver quem você realmente é!

O silêncio caiu.

Isabella, ainda trêmula, encarava o homem à sua frente. Nério limpou o sangue do canto da boca e a olhou de volta.

— Está ferida?

Ela negou com a cabeça, embora o coração doesse.

— Então por que voltou por mim? — sussurrou.

— Porque, mesmo sem te amar... eu não suportaria ver você machucada. Eu já perdi Cristina. Não vou perder mais ninguém por minha culpa.

Ela sentiu um arrepio. Pela primeira vez, não viu o monstro que a comprou. Viu um homem dividido entre o passado e algo novo.

Talvez ele ainda não soubesse... mas algo dentro dele já começava a mudar.

A estrada de volta foi silenciosa. Isabella se encolheu no banco do carro, tentando absorver tudo o que tinha acabado de acontecer. A traição de Adriano ainda ecoava em sua mente, como uma faca cravada em suas costas. Do outro lado, Nério dirigia em silêncio, os olhos fixos na estrada, a mandíbula cerrada.

— Então... Cristina — ela disse, sem conseguir conter a amargura na voz. — Você estava apaixonado por outra. E mesmo assim me comprou.

Nério respirou fundo, mas não desviou o olhar da estrada.

— Não é tão simples.

— Parece bem simples pra mim. Você não podia ter a mulher que amava, então arrumou uma substituta.

— Você não é uma substituta.

— Não? — Ela soltou uma risada seca. — Então o que sou, Nério?

Ele finalmente a encarou por um instante. Nos olhos dele, havia cansaço... e algo mais. Um peso antigo, que parecia esmagá-lo por dentro.

— Quando eu vi você pela primeira vez, naquela agência de modelos, achei que era só uma solução. Mas você... você me confundiu.

— Confundi? — ela repetiu, num sussurro.

— Você é diferente de tudo o que eu conheci. Te trouxe pra perto por necessidade, sim. Mas manter você por perto... não foi por isso.

Isabella virou o rosto, os olhos marejados. Estava farta de promessas partidas, de verdades pela metade.

O carro parou diante da mansão. Nério saiu primeiro e deu a volta para abrir a porta. Ela hesitou por um segundo, depois desceu. O ar da noite estava frio, e ela sentiu um arrepio. Nério notou.

— Vou pedir que preparem um quarto novo pra você. Mais arejado. Com janela.

Ela arqueou as sobrancelhas.

— Agora quer me tratar bem?

— Eu devia ter feito isso desde o início.

Os olhos de Isabella se fixaram nos dele. Por trás da postura dura, ela enxergava as rachaduras. Não sabia se era real, mas pela primeira vez, queria acreditar.

Foram recebidos por Carla, a governanta, que observou Isabella com um misto de surpresa e alívio. Nério deu instruções rápidas e subiu para o segundo andar. Isabella foi levada para um quarto espaçoso, com uma grande janela de vidro que dava para o jardim. As cortinas balançavam com o vento, e o cheiro de lavanda preenchia o ambiente.

Ela sentou-se na cama, os pensamentos em turbilhão.

Nério. Cristina. Adriano.

Como tudo tinha se transformado tão rápido?

Horas se passaram. Ela não conseguia dormir. Levantou-se e caminhou até a varanda do quarto. O jardim estava iluminado por postes baixos. Ao longe, ela viu Nério, sozinho, sentado num banco de pedra, um copo na mão. Parecia derrotado.

Movida por um impulso, Isabella desceu as escadas em silêncio e atravessou o jardim. Quando se aproximou, ele não se virou.

— Não consegue dormir? — ele perguntou, como se soubesse que era ela.

— Não.

— Eu também não.

Ela sentou-se ao lado dele, mantendo certa distância. Ficaram alguns segundos em silêncio, até que Isabella falou:

— Me diz... por que Cristina?

Ele sorriu, amargo.

— Ela foi o meu primeiro amor. Crescemos juntos, mesmo de longe. Toda vez que havia uma negociação com a máfia francesa, eu dava um jeito de vê-la. Ela era corajosa, inteligente... e filha do nosso maior inimigo.

— Nunca pensaram em fugir?

— E abandonar tudo? Minha família? Meu legado? — Ele riu, sem humor. — Não tínhamos esse luxo. Nossos nomes sempre falaram mais alto que nossos desejos.

— E agora?

— Ela se casou com outro. Um aliado político. Uma união estratégica.

— E você ficou com o trono... e uma garota ingênua que sonhava em ser modelo.

— Eu sei que não posso pedir perdão.

— Não, não pode.

Isabella o encarou. Por mais que quisesse odiá-lo, não conseguia. Havia algo quebrado em Nério... e essa ferida o tornava mais humano.

— Você ainda ama Cristina?

— Sim. — Ele respondeu sem hesitar. Mas depois acrescentou: — Só que hoje... esse amor parece muito distante. Como uma lembrança de outra vida.

Isabella olhou para o céu. As estrelas estavam escondidas pelas nuvens.

— Então talvez haja espaço pra algo novo — murmurou.

Nério a olhou, surpreso. Ela se levantou e voltou para dentro, deixando-o sozinho.

Naquela noite, ele não dormiu. Pela primeira vez em anos, não pensava em Cristina. Pensava nos olhos castanhos que o desafiaram desde o começo. Na coragem de Isabella. E se perguntou: o que seria mais perigoso... perder o poder ou se permitir amar de novo?

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