EPISÓDIO 1
Liz precisava de café. Não era apenas um desejoera uma necessidade vital. Depois de uma noite inteira em claro, afundada em anotações e gráficos para a temida prova de Economia, seus neurônios pareciam implorar por cafeína. Seus olhos ardiam, os músculos do pescoço estavam tensos e a paciência… essa ela havia deixado em algum parágrafo de teoria monetária. Entrou no café do campus apressada, prendeu o cabelo em um coque desajeitado com o primeiro elástico que encontrou na bolsa e foi direto ao balcão pedir seu combo de sobrevivência: cappuccino forte, sem açúcar, e um pão de queijo.
Simples, funcional, direto ao ponto. Como ela.
Do outro lado do ambiente, Rian Cárter já estava acomodado em uma das mesas perto da janela. Camisa social branca com as mangas dobradas de forma casual, calça de alfaiataria, relógio caro e um ar de indiferença elegante enquanto rolava a tela do celular. Estava ali só de passagem. Ou ao menos era o que pensava. Pedira um café com leite de amêndoas e um croissant amanteigado, seu café da manhã padrão, refinado e calculado como tudo em sua vida. Nada fora do script.
Até que o script falhou.
— Cappuccino sem açúcar e pão de queijo! — chamou a atendente, colocando a bandeja no balcão.
Antes que Liz pudesse se aproximar, Rian pegou a bandeja sem sequer levantar o olhar. Caminhou até a mesa novamente, distraído, como se o mundo estivesse sempre pronto para servir exatamente o que ele queria.
Liz parou, franzindo a testa, e olhou para o balcão vazio. Aquilo só podia ser piada.
Foi até ele, sem hesitar.
— Com licença
— disse, firme.
— Esse pedido é meu.
Rian ergueu os olhos do celular. Castanhos intensos, escuros como a noite, encontrando os olhos cor de mel dela. Houve um segundo de silêncio. Depois, um segundo a mais de julgamento mútuo.
— Acho que não
— respondeu ele com um meio sorriso, levantando o copo.
— Eu pedi cappuccino.
— Sem açúcar?
— ela rebateu, arqueando uma sobrancelha.
Ele olhou o copo com desinteresse, então leu o rótulo com uma careta discreta.
— Isso é crime.
— Exatamente. Então... devolve.
— Calma, garota brava. Pega o outro ali. Aposto que tem o seu nome.
— Eu não coloquei meu nome.
— Ela esticou a mão com impaciência.
— Só quero o meu café. O meu café.
Ele apoiou o braço na mesa, analisando-a com um ar divertido.
— Você é sempre assim mal-humorada de manhã ou só quando vê um homem bonito?
O sorriso dele era irritante. Confiante demais. Provocador demais.
Ela bufou, cruzando os braços.
— Só quando vejo um idiota.
Ele soltou uma risada baixa, como se tivesse acabado de ouvir a melhor resposta do dia.
Antes que a tensão aumentasse, a atendente apareceu, ofegante, com o outro pedido na mão.
— Desculpem... trocamos tudo.
Liz pegou sua bandeja sem dizer mais nada. Não queria dar a ele nem mais uma palavra. Se afastou pisando firme, sentindo o olhar dele grudado em suas costas até ela se sentar numa mesa distante.
Rian observou enquanto dava um gole no café errado, fazendo uma careta ao sentir o amargor que não esperava. Mas logo riu sozinho, como se tivesse acabado de encontrar algo, ou alguém interessante o suficiente para mexer com sua rotina perfeitamente entediante.
Ele não sabia o nome dela. Ainda.
Mas já estava decidido a descobrir.
EPISÓDIO 2 —
Liz achou que aquele encontro desastroso com o “arrogante do café” ficaria no passado. Só mais um dia estranho na sua vida caótica, certo? Errado. Totalmente errado.
Naquela manhã, ela chegou cedo como sempre. Gostava de se sentar nas primeiras fileiras,não por querer chamar atenção, mas porque ali ela podia enxergar melhor, ouvir com clareza e fingir que o resto do mundo não existia. Era o seu pequeno refúgio.
Mas havia algo diferente no ar. Um burburinho, cochichos animados, sorrisos maliciosos. Liz levantou uma sobrancelha ao ouvir fragmentos das conversas atrás de si.
— O novo professor chega hoje. Ouvi dizer que ele é um empresário de sucesso... tipo, MUITO sucesso.
— Rico, lindo e, dizem, solteiro.
— Deve ser velho, né?
— Que nada! Disseram que tem menos de 30. CEO de uma empresa gigante. Imagina, uma aula com um deus grego.
Liz revirou os olhos, abrindo seu caderno.
“Grande coisa. Aposto que nem sabe dar aula”, pensou, enquanto rabiscava seu nome no canto da folha.
O som da porta se abrindo foi suficiente para silenciar a sala. A energia mudou. Foi quase como se o tempo parasse por um segundo.
Liz nem olhou de imediato. Estava acostumada com os exageros da turma, qualquer pessoa com aparência decente já causava alvoroço. Mas então, ela ouviu:
— Espero que hoje ninguém tente roubar meu café.
A voz. Aquela voz.
Seu corpo inteiro ficou tenso. Lentamente, ela ergueu o olhar.
E lá estava ele.
Rian Cárter.
Camisa branca com as mangas dobradas até os antebraços, um relógio de luxo que brilhava discretamente no pulso, olhos claros, que varriam a sala como se ele tivesse criado aquele ambiente, como se fosse dono de tudo e de todos. O sorriso, cínico. O olhar... direto nela.
Liz sentiu o sangue sumir do rosto.
— Você?! — sussurrou, incrédula.
Ele retribuiu com um sorriso satisfeito, reconhecendo-a de imediato.
— Ah... minha aluna favorita. Que coincidência agradável.
Alguns alunos riram, sem entender o que estava acontecendo de verdade. Para eles, era apenas uma brincadeira charmosa. Para Liz, era o começo do apocalipse.
— Isso só pode ser brincadeira — ela murmurou, fechando o caderno com força.
Rian caminhou até a mesa da frente, largou a pasta com elegância e se apoiou nela com o tipo de casualidade que só alguém absurdamente confiante conseguiria.
— Meu nome é Rian Cárter. Vou ministrar o módulo de Estratégias de Negócio e Inovação nas próximas semanas. CEO da CárterTech, consultor em três multinacionais e viciado em café — sem açúcar, por favor.
A sala riu mais alto dessa vez. Liz quis cavar um buraco e se enterrar ali.
— Mas o mais importante
continuou ele, com os olhos fixos nela
— é que eu adoro perguntas inteligentes. E detesto grosserias matinais em cafeterias.
O olhar de Liz disparou labaredas. Ele estava zombando dela. Na frente de todos.
Respirou fundo e tentou ignorar, voltando o rosto para o caderno.
“Respira, Liz. Ele é só um professor. Um professor temporário. Você consegue lidar com isso.”
Mas no fundo, ela sabia. Aquilo não ia terminar ali. Rian Cárter parecia o tipo de homem que gostava de brincar com fogo. E, por algum motivo, havia escolhido justamente ela como alvo.
No final da aula, enquanto todos saíam comentando sobre o quão "maravilhoso e diferente" ele era, Liz tentou escapar discretamente. Mas antes que chegasse à porta, ouviu novamente aquela voz mais baixa, agora, só para ela:
— Ei, aluna da sala errada...
Ela parou, sem se virar.
— Prepare-se. Essa aula vai ser bem... intensa.
Liz saiu sem responder. Mas por dentro, algo pulsava forte. Raiva. Orgulho ferido. E uma inquietação estranha que ela não queria e não sabia nomear.
A guerra tinha começado.
EPISÓDIO 3 —
Liz passou a aula inteira de braços cruzados, encarando Rian como se ele fosse um inimigo declarado. E talvez fosse. Cada palavra, cada gesto dele a fazia sentir um incômodo crescente, como se ele tivesse o poder de invadir seu espaço sem pedir permissão. Ela detestava aquele sorriso arrogante, a forma como ele parecia sempre ter controle de tudo até das pessoas ao seu redor.
Ele fingia não notar, mas vez ou outra seus olhos se encontravam com os dela. E sempre que isso acontecia, uma tensão indescritível se formava no ar, como se o simples ato de olhar um para o outro fosse suficiente para criar uma conexão ou talvez uma colisão. E o maldito ainda sorria, como se estivesse se divertindo com tudo aquilo.
Era irritante. Arrogante. Intenso.
Liz desviava o olhar imediatamente sempre que seus olhos se cruzavam com os dele, mas a sensação de estar sendo observada não desaparecia. Ela tentava se concentrar na aula, mas a presença dele, como sempre, a desestabilizava. Ele não precisava falar, apenas estar ali já era o suficiente para deixá-la desconfortável. Ele sabia como fazer isso, como sempre fazia com todos ao seu redor.
No final da aula, enquanto os alunos se aglomeravam em volta da mesa, empolgados para tirar selfies com o "professor gato", Liz permaneceu sentada. Guardava os materiais com calma exagerada, como se a pressa tivesse desaparecido do seu corpo. Na verdade, só queria evitar a muvuca e principalmente ele.
Mas, claro, o universo parecia gostar de pregar peças.
— Está fugindo de mim, aluna número um?
Rian falou ao se aproximar, parando ao lado da mesa dela com aquele sorriso presunçoso estampado no rosto. Ele se aproximava dela como se tivesse todo o direito do mundo, sem hesitar.
Liz levantou o olhar, firme, sem se intimidar. Seus olhos castanhos fixaram-se nos dele com determinação, mas no fundo, uma pontada de algo mais a fez hesitar por um segundo. Não era medo, não, mas algo estranho que ela não queria admitir nem para si mesma.
— Só estou tentando evitar mais uma troca de cafés… ou de egos inflados.
Ele soltou uma risada baixa, quase divertida. Como se aquilo fosse a coisa mais engraçada do mundo.
— Você tem sempre uma resposta na ponta da língua, né?
Liz o ignorou por um instante, voltando a arrumar seus materiais. Não tinha tempo para perder com aquele tipo de conversa. Mas ele não desistiria tão fácil. Ele nunca desistia.
— E você tem sempre um comentário arrogante pronto.
— Gosto disso.
Ele inclinou a cabeça levemente, os olhos fixos nela. O tom de voz dele era suave, quase sedutor.
— Você não baixa a guarda. A maioria das pessoas tenta me agradar.
Ela estremeceu por dentro, mas não cedeu. Era sempre assim. Ele jogava com as palavras e ela se sentia desafiada a não deixar transparecer o quanto ele a mexia. Mas, por dentro, um pedaço de si desejava, quase sem querer, baixar a guarda. Mostrar um pouco de quem realmente era. Mas isso não aconteceria. Não com ele.
— Pois eu não sou a maioria
disse, levantando-se devagar e ficando frente a frente com ele. O rosto dele estava ali, a poucos centímetros do seu, e ela podia sentir o cheiro de seu perfume algo que a fazia querer desviar os olhos, mas não podia.
— E, sinceramente? Ser seu fã não está nos meus planos.
Rian a observou por um instante, o sorriso sumindo apenas por um segundo. Era como se ele estivesse analisando cada palavra, cada gesto dela. Como se, no fundo, estivesse tentando entender algo mais profundo do que apenas uma provocação. Depois, deu um passo para o lado, abrindo caminho com um movimento sutil, mas intencional.
— Até semana que vem, Liz.
Ela travou. Como ele sabia seu nome?
— Como...?
— Está na lista de chamada
ele respondeu, dando de ombros, mas com um brilho travesso nos olhos. Ele estava se divertindo com o desconforto dela.
— E porque você é difícil de esquecer.
Liz saiu da sala com o coração acelerado, mas o semblante firme. Não ia dar moral. Não podia. Ele era exatamente o tipo de problema que ela sempre evitou: bonito demais, seguro demais, acostumado a ter tudo e todos aos seus pés.
Ela caminhou pelos corredores, tentando se acalmar. Mas uma sensação estranha a acompanhava, como se Rian tivesse invadido não só o seu espaço físico, mas também o território do seu pensamento. Ela tentava se convencer de que não deveria se importar. Ele era apenas mais um arrogante. Mas, por dentro, sabia: ele já estava mexendo com ela.
Cada olhar trocado, cada frase provocadora. Ele não a deixava em paz. E o pior? Ela não queria que ele a deixasse em paz.
Era como se estivessem numa guerra silenciosa, onde nenhum dos dois estava disposto a ceder. E pior: uma parte dela, uma parte que Liz lutava para ignorar ,começava a gostar do desafio. Ele a desafiava constantemente, e, de alguma forma, ela se via sendo puxada para esse jogo.
Ele era um campo minado, e ela sabia. Mas tinha algo nos olhos de Rian Cárter que parecia chamá-la para o perigo.
E, pela primeira vez em muito tempo, Liz não tinha certeza se queria recuar.
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