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O Beijo do Vampiro ( VL.2)

Capítulo 1

...D͢E͢D͢I͢C͢A͢T͢ÓR͢I͢A͢...

→Aos corações que batem mais forte por aquilo que não se pode ter.

Aos que acreditam que o amor verdadeiro desafia o tempo, a morte… e até a imortalidade.

Que este livro te envolva como um beijo roubado à meia-noite, com gosto de perigo e eternidade.

Que você se perca e se encontre entre suspiros, promessas e fangs.

Com todo o meu amor sombrio,

— Senhoryta Kim

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O frio era a primeira coisa que senti.

Cortante. Agudo. Quase insuportável.

Como uma lâmina mergulhada em meu peito, lenta, preguiçosa. A dor não era nova. Ela me conhecia. Me saudava como uma velha amiga que nunca partira de verdade. E quando abri os olhos, tudo que vi foi um mundo que não reconhecia. Um teto estranho. Lâmpadas brancas. Um cheiro de metal estéril e ozônio.

O som veio depois. Apitos agudos. Um zumbido constante. O tic-tac de algo eletrônico conectado ao meu corpo. Meu peito arfava, mas eu não precisava de ar. Meu coração, no entanto, pulsava. Fraco. Lentamente acordando, como se também tivesse esquecido como viver.

Eu morri. Eu sei que morri.

Mas algo me puxou de volta.

E não foi misericórdia. Foi maldição.

— Ele acordou. — Uma voz masculina, grave, vibrando com surpresa e reverência.

Virei o rosto com dificuldade. A claridade era insuportável. Meus olhos, antes acostumados à escuridão eterna da morte, lutavam para compreender esse novo universo.

Havia um homem parado ao lado da cama. Imponente. Alto. Um olhar antigo, como o de um rei em exílio. Cabelos prateados presos num coque baixo, barba bem aparada. Terno preto. E olhos... olhos vermelhos como brasas prestes a incendiar o mundo.

— Bem-vindo de volta, Isaac.

Meu nome.

Ele disse meu nome.

Mas como ele sabia?

Minha memória era um espelho quebrado. Estilhaços soltos. Fragmentos de uma existência queimada. Lembranças vinham como murros: sangue, espadas, um castelo em chamas, uma mulher com olhos verdes gritando meu nome. E depois, apenas escuridão.

O homem se inclinou levemente, como se reconhecesse algo em mim.

— Sou Mark. E você está em minha casa agora. Não tema. Está entre os seus.

Entre os meus? Não havia mais "os meus". Todos estavam em outro universo. Eu sei. Eu vi.

— Não é possível... — murmurei. Minha voz saiu rouca, seca. Como papel sendo rasgado.

Mark sorriu. Não era um sorriso humano. Era o sorriso de um predador que observa outro predador reconhecer sua própria natureza.

— Você dormiu por muito tempo. Mais de quinhentos anos. Mas o mundo ainda precisa de você, Isaac Eckart.

Meu sobrenome.

Não era apenas meu nome. Era uma herança. Um peso. Uma condenação.

Sentei com dificuldade. Meu corpo parecia ter sido feito de pedra e, ainda assim, cada músculo pulsava com uma força monstruosa. Algo novo corria em minhas veias. Algo antigo também. Uma mistura de fúria, fome e saudade.

— Por que eu? — perguntei, encarando aquele homem com olhos ainda em mutação.

Mark caminhou até uma grande janela e abriu as cortinas. A luz do sol entrou violentamente. Reagi com um grunhido, instintivamente cobrindo os olhos.

Mas... não queimou.

Eu não explodi em chamas. Não fui reduzido a cinzas. Apenas doeu. Como se minha pele estivesse se adaptando a um novo tempo.

— Porque você é o último de sangue puro. O único. Um legado que nem o tempo conseguiu apagar. E você foi trazido aqui por algo maior do que ambos. — Ele se virou, encarando-me com seriedade. — Seu sangue... é a chave.

Chave pra quê?

As perguntas ferviam, mas a fome era maior. Uma fome antiga, animal, insaciável. Meu corpo inteiro gritava por sangue. Mas não era qualquer sangue. Eu queria algo mais... especial. Denso. Quente. Vivo.

Mark estalou os dedos.

Uma porta se abriu, e uma mulher entrou. Pele pálida, veias saltando do pescoço, olhos vazios como vidro. Ela se aproximou, expôs o pulso e se ajoelhou.

Eu hesitei.

Mas então, a besta dentro de mim rugiu.

Em um segundo, eu estava sobre ela. Presas cravadas. O gosto me atingiu como um raio. Era... inebriante. Como se cada célula do meu corpo estivesse acordando de um coma eterno. Quando terminei, empurrei o corpo dela com nojo e vergonha.

Mark apenas observava, impassível.

— Seu instinto ainda está lá. Isso é bom. Vai precisar dele.

— Onde eu estou realmente?

— Canadá. Nos subterrâneos de Montreal. Mas o mundo que você conhecia não existe mais. Agora há novas regras. Novos clãs. E também caçadores.

Caçadores. Sempre há caçadores.

— E você? O que é? — perguntei.

— Antigo. Forte. Mas não puro. — Ele se aproximou. — Por isso, você é especial. E é por isso que o mundo vai querer te controlar... ou destruir.

Suspirei. Era sempre assim. Nunca liberdade. Sempre guerra.

— E o que você quer de mim?

— Que viva. Que se adapte. Que aprenda. Porque, no fim, quando a guerra começar, você vai estar no centro dela.

Mark saiu, deixando-me sozinho com meu reflexo distorcido num espelho grande. Toquei meu rosto. A pele era fria. Mas meus olhos... mudavam de cor conforme a fome e o humor.

Azul. Vermelho.

Meu nome era Isaac Eckart.

E eu acabava de acordar num mundo que ainda não fazia ideia do inferno que estava por vir.

Capítulo 2

Despertei em meio ao som de risos contidos e conversas abafadas por paredes de mogno. A mansão era uma fera viva. Cada parede parecia respirar. Cada quadro sussurrava coisas que eu não compreendia ainda — e talvez nem quisesse compreender.

Mark havia me deixado ali, por um momento, para “me adaptar”. Como se isso fosse possível.

Adaptar. Palavra bonita pra quem tem séculos de caos correndo nas veias.

Subi a escada de mármore polido como se pisasse sobre tumbas. O lugar todo era banhado por uma luz filtrada e fria, meio sépia, meio celestial. Uma ilusão bonita — mas toda beleza nesse mundo moderno tinha gosto de veneno doce.

No andar de cima, uma porta se abriu. E eu vi o primeiro monstro.

Ou melhor, ela.

— “Você é o tal perdido?” — a voz soou mais como zombaria do que curiosidade.

Uma garota de olhos prateados, cabelo azul platinado e botas de salto como lâminas de guerra. Os lábios pintados num vermelho que parecia sangue fresco. Ela se encostou no batente da porta com o ar entediado de quem já tinha visto cem apocalipses e estava esperando o próximo.

— Depende — respondi. — Você é a síndica dessa cova?

Ela riu. Aquela risada insuportavelmente sensual de quem sabe que todo mundo olha.

— Sou a Olivia Eckart. Filha do Mark. E você... deve ser o novo brinquedo dele.

Brinquedo.

A palavra bateu fundo como um tapa na alma.

— Eu sou Isaac — rosnei, aproximando-me, encurtando a distância até o ponto em que nossos corpos quase se tocavam. — E se você se referir a mim assim de novo, vai precisar de outro espelho.

Ela piscou devagar, e um arrepio percorreu minha nuca — bem no ponto em que a marca ardia. A borboleta invisível queimava como se tivesse ouvidos.

— Hm. Você é diferente — ela sussurrou, passando por mim como fumaça. — Gosto disso.

O corredor seguinte abriu-se em um salão de vidro, onde dois vampiros estavam sentados como reis decadentes. Um era alto e magro, com olhos cinzentos e cabelo branco como papel queimado. O outro parecia saído de um romance trágico francês — moreno, olhos escuros, expressão amarga.

— Finalmente, o famoso Isaac — disse o moreno. — Achamos que você era uma lenda. Ou uma piada muito cara do Mark.

— Se sou uma piada, então reza pra eu nunca contar o final — respondi, e sentei sem pedir permissão.

Mark chegou logo depois. Terno escuro, presença como trovão. Quando ele falava, até o chão se calava.

— Isaac, esses são Caelum e Dante. Meus filhos. Biológicos... ou quase.

Eles me estudavam como caçadores observam uma fera acorrentada. Como se tentassem prever se eu ia obedecer ou morder.

A resposta era óbvia.

Mark me lançou um olhar de aprovação velada e completou:

— Você vai morar conosco agora. Mas não se engane. Você está aqui por um motivo.

Claro que estou. Sempre há um motivo. Uma guerra. Uma maldição. Um coração preso ao outro por uma Geis invisível.

A marca em minha nuca ardeu mais uma vez — violenta como se alguém tivesse encostado metal incandescente.

E pela primeira vez, a dor me roubou o fôlego.

— Algo errado? — perguntou Olivia, sua voz mais baixa, quase interessada agora.

— A sua decoração é de mau gosto — menti, limpando o suor frio da nuca.

Eles riram. Mas Mark não. Ele sabia. Ele sentia. Aquela marca... a Geis... ela não era apenas um símbolo. Era um contrato eterno.

E mesmo congelada por Sofia, ainda estava viva.

Porque ela ainda estava viva. Ela, a dona do outro lado da maldição.

Mas quem era ela? Por que aquela sensação... esse buraco no peito que aumentava a cada dia?

 

A noite caiu como um véu de luto. A mansão ficou mais silenciosa, como se estivesse em vigília.

Sozinho no quarto, olhei meu reflexo no espelho — o corte de cabelo, mais selvagem, os olhos... ainda os mesmos.

Azul com veios de vermelho. Como fogo congelado.

As pontas dos dedos tocaram a nuca. E por um instante, eu vi.

Uma mulher. Uma sombra.

Olhos verdes. Cabelos cacheados.

Sangue escorrendo dos lábios.

“ Ninguém nunca... me fez sentir o que você fez...”

A imagem sumiu tão rápido quanto veio. Mas o calor ficou. O desejo. O medo. A fome.

Algo nela chamava tudo em mim.

E eu ainda nem sabia o nome dela.

 

No andar de baixo, Olivia e Dante conversavam baixinho com Mark. O nome “Ordem de Lys” foi sussurrado como se chamasse a própria morte.

Caçadores estavam de volta à ativa. E eles sabiam de mim.

— Ele é o elo perdido — disse Caelum. — E o coração dele está amarrado a alguém que ainda vive. Se essa pessoa morrer...

— Ele morre junto — completou Mark.

Olivia sorriu.

— Ah, o romance trágico... sempre foi a parte mais deliciosa da maldição.

 

Enquanto isso, eu fui até o jardim da mansão. Precisava respirar. Mentira — precisava caçar.

Mas ao cruzar os portões de ferro, uma brisa quente me envolveu. E, por um instante, senti o cheiro dela.

Rosas. Canela. Um toque de lavanda.

Ela ainda estava longe.

Mas cada batida do meu coração chamava pelo dela.

E logo... logo nos encontraríamos.

Capítulo 3

A noite tinha dentes. Eu os sentia me mordendo enquanto saía da mansão sem fazer barulho. Um pé na varanda, o outro no vazio — e então, o salto para além dos portões. Como um predador que escapa da própria jaula.

Não disse nada a Mark. Nem a Olivia. Muito menos a Dante. Eles me dariam sermão, ou pior: mandariam alguém me seguir. E eu precisava estar sozinho. Caçar. Sentir o gosto da vida nas veias de alguém.

O mundo moderno tem cheiro de gasolina, suor e pessoas vazias. Mas o sangue… ah, o sangue ainda é o mesmo. Quente. Cheio de segredos.

Atravessei vielas e avenidas como uma sombra, atraído por sons, cheiros, batidas de corações que sequer sabiam que estavam prestes a silenciar.

Encontrei um deles atrás de uma boate. Um homem de terno, provavelmente um advogado ou algo do tipo, rindo no telefone enquanto fazia xixi num beco escuro. Tão vulnerável. Tão idiota.

A fome me guiou. Rápida. Sutil. Silenciosa.

Minhas presas atravessaram sua pele como se beijassem a vida.

O gosto era amargo. Carregado de ansiedade, cafeína, e culpa de adultério.

Não era o melhor sangue da noite, mas bastava.

Limpei os lábios com o dorso da mão, joguei o corpo para trás do lixo e segui andando.

Foi então que vi as luzes.

Um bar.

O néon pulsava em vermelho e azul, como um coração em agonia. “Skyfall” era o nome. E havia música demais vindo de lá. Conversas demais. Gente demais.

Perigo demais.

Perfeito.

Empurrei a porta com o ombro, e o bar inteiro congelou por um segundo. Todos os olhos caíram sobre mim. Como se o mundo parasse para observar algo que não deveria estar ali.

Homens franziram o cenho. Mulheres arregalaram os olhos.

Algumas bocas se entreabriram.

Outras morderam o próprio lábio.

Caminhei até o balcão como se já fosse dono do lugar.

E foi quando eu a vi.

Sentada com um grupo de mulheres — talvez amigas, talvez espectadoras de um espetáculo sem saberem — estava ela.

Pele morena dourada sob a luz quente.

Cabelos loiros lisos, escorrendo pelas costas como ouro líquido.

Olhos azuis, tão intensos que me deixaram cego por um segundo.

Mas não era apenas a beleza.

Era a sensação.

Aquela impressão de que eu já havia a visto. Que seus traços, seu perfume, os olhos dela, me levavam a outro lugar. Outro rosto.

Algo no peito apertou.

Não a fome.

A Geis.

A borboleta invisível queimou devagar na minha nuca, como se estivesse acordando.

Ela riu de algo que uma das amigas disse, mas seus olhos me notaram.

E quando notaram, pararam.

Como se o tempo tivesse virado líquido e a engolido inteira.

Tirei o casaco devagar e sentei ao lado dela no balcão. O silêncio entre nós era denso como veludo molhado.

Ela piscou duas vezes antes de se forçar a dizer algo.

— Uau… você caiu do céu?

Sorri de canto.

— Não. Saí do inferno pela porta da frente.

Ela riu, um riso tímido e sensual ao mesmo tempo. Como se não soubesse se deveria fugir ou puxar conversa.

— Qual o seu nome, estranho misterioso? — ela perguntou, tocando o copo com a ponta dos dedos.

Eu hesitei. Não costumo dar nomes a presas em potencial. Mas ela não era isso. Algo nela me intrigava. Me chamava.

— Isaac.

— Isaac… — ela repetiu, como se provasse o som com a língua. — Bonito.

— E você?

Ela sorriu de lado. E seus olhos azuis pareceram mais claros, por um instante.

— Ana.

O nome me atingiu como um golpe.

Ana.

Conhecia esse nome. Não da memória — da sensação. Da dor antiga.

Era um nome com cheiro de rosas.

Com um gosto de lembrança.

Mas eu nunca tinha visto Ana antes. Não nessa vida.

Então por que… por que quando olhava nos olhos dela, eu sentia o eco dos olhos de outra pessoa?

Verde.

Verde como floresta.

Verde como maldição.

E por um segundo, eu vi.

O rosto de outra mulher. Mais jovem. Mais selvagem.

Cabelos cacheados. Um riso triste. Um beijo roubado.

Mas era só uma ilusão.

Ou não?

— Você tá bem? — Ana perguntou, tocando meu braço.

O toque foi quente. Real. Intenso.

— Sim — menti. — Só… você me lembrou alguém.

Ela inclinou a cabeça, curiosa.

— Alguém importante?

— Talvez — disse, olhando diretamente para os olhos dela. — Ou talvez alguém que ainda vou conhecer.

Ela corou.

Corar. Que coisa mais humana.

O mundo moderno era podre de artifícios. Mas ela… Ana… parecia tão real que doía.

Conversamos por minutos. Ou horas. Não sei. Ela me contou que trabalhava com moda. Que gostava de escrever poesias nas horas vagas, mas tinha vergonha de mostrar e que tinha uma irmã mais nova que morava no interior do Canadá com a sua mãe.

E eu, como sempre, menti pouco e omiti muito.

Mas uma coisa me perturbava: por que a Geis reagiu a ela?

Por que aquela marca maldita ardia quando ela dizia meu nome?

E por que, nos olhos dela, eu via o rastro de alguém que ainda não conhecia — mas que me conhecia profundamente?

---

O bar começou a esvaziar. As amigas dela foram embora, deixando sorrisos e piscadelas no ar. Ana ficou.

— Você quer me acompanhar até o carro? — ela perguntou, brincando com a chave.

— Claro — respondi, levantando e oferecendo o braço.

Ela o aceitou. E enquanto saíamos, a brisa noturna nos envolveu como um feitiço.

Na rua vazia, perto de um poste quebrado, ela parou.

— Posso te perguntar uma coisa, Isaac?

— Pode.

— Por que eu sinto que você está prestes a fugir?

A pergunta me pegou. Na alma.

Toquei o pescoço, onde a marca ardia.

E respondi com a verdade mais crua que consegui formular.

— Porque talvez... eu esteja.

Ela me encarou. Os olhos azuis dela eram bonitos. Mas não eram os olhos certos.

Não eram os olhos verdes que a minha alma procurava.

Mas ela era um espelho. Uma sombra.

A irmã.

Eu não sabia disso ainda.

Mas o destino já sabia.

E estava sorrindo.

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