Luana Oliveira sempre fora uma mulher de vida simples. Nascida e criada em São Paulo, ela nunca teve grandes ambições, exceto dar conta do seu trabalho como assistente em uma pequena loja de móveis. Suas noites eram tranquilas, muitas vezes acompanhadas de livros ou filmes de comédia romântica. Tudo mudou quando, após uma entrevista que mais parecia uma oportunidade perdida, Luana recebeu a oferta de trabalho para ser a cuidadora de Caio Duarte, um empresário que, até pouco tempo atrás, parecia ter tudo o que desejava: sucesso, riqueza, saúde e um futuro promissor. No entanto, um acidente de carro havia mudado tudo para Caio, tornando-o "tetraplégico"( será que isso irá mudar?) e, de certo modo, refém de um sofrimento físico e emocional que ele não sabia como lidar.
A casa de Caio era impressionante. Uma mansão moderna e imponente, com paredes de vidro que ofereciam uma vista deslumbrante da cidade, algo que Luana nunca imaginou que veria de perto. Ela foi recebida por uma governanta que, de maneira fria, a conduziu até o homem que ela deveria cuidar. Ao entrar no quarto de Caio, sentiu-se imersa em uma atmosfera densa e desconfortável. Ele estava sentado em uma cadeira de rodas, os braços repousados sobre os apoios, com os olhos fixos no horizonte, como se ali estivesse toda a sua tristeza. Seus olhos eram profundos e tristes, uma expressão de quem havia perdido mais do que apenas a mobilidade.
“Então, você é a nova cuidadora”, disse ele, sua voz carregada de desdém. “Não sei por que estou aqui, mas imagino que você também não saiba. O que pensa que vai mudar? Não vou ser fácil.”
Luana ficou em silêncio, sem saber como responder. Ela havia lido sobre a situação de Caio, mas estava longe de imaginar o peso do que ele carregava. Ele não queria ajuda, ela sabia disso. E, no entanto, algo dentro dela dizia que essa era uma chance única de provar a si mesma que podia fazer a diferença na vida de alguém. Mas Caio não facilitava. Cada palavra que ele dizia parecia um golpe, um afastamento ainda maior.
“Você tem razão”, Luana respondeu finalmente, com a voz firme. “Eu não sei o que você está passando, mas sei que posso tentar fazer algo. Nem que seja apenas escutar.”
Caio a olhou com um misto de raiva e cansaço. “Escutar não vai mudar nada. A minha vida acabou.”
Luana sentiu um nó na garganta. Como ela poderia mudar a mentalidade dele? Como ela poderia curar uma dor tão profunda?
Nos dias seguintes, Luana teve que se acostumar com o fato de que Caio não falava com ela, ou, quando o fazia, eram palavras duras, sem qualquer traço de gentileza. Ele rejeitava qualquer tipo de interação que pudesse parecer "humanizante". Ele estava tão absorto no sofrimento de sua condição, que mal notava o esforço que Luana fazia para criar um ambiente mais acolhedor.
Havia dias em que ela pensava em desistir, quando a frustração tomava conta e as palavras de Caio eram como facas afiadas. Mas algo a fazia continuar. Ela sabia que não seria fácil, mas ela também sabia que as grandes transformações nunca vinham sem desafios. E, por mais difícil que fosse, ela estava determinada a ajudar aquele homem a ver que a vida poderia ainda oferecer algo, mesmo que fosse diferente de tudo o que ele imaginava.
O Encontro
Luana começa a entender um pouco mais sobre Caio e a difícil jornada que ele enfrenta. Durante o tempo em que ela cuida dele, ela se depara com a resistência constante do homem, que insiste em se afastar de todos os que tentam ajudá-lo. Porém, ao longo dos dias, Luana começa a perceber que por trás da fachada de arrogância e raiva, há um homem que ainda sofre profundamente.
Na manhã seguinte, Caio parecia ainda mais distante. Seu olhar estava perdido, e ele mal reagiu quando Luana entrou no quarto para ajudá-lo com o café da manhã. Ela havia preparado uma pequena surpresa: uma mesa simples com frutas frescas, pães e sucos, esperando que ele aceitasse algum gesto de bondade.
"Isso não vai funcionar", disse Caio, sem sequer olhar para a comida. "Eu não preciso disso."
Luana, no entanto, se manteve firme. Sabia que Caio precisava de algo além de cuidados físicos. Ele precisava de alguém que o ajudasse a reconstruir, peça por peça, a visão que ele tinha de si mesmo. Mas, para isso, teria que encontrar uma maneira de penetrar a parede de gelo que ele havia erguido ao seu redor.
Nas semanas que se seguiram, Luana tentou várias abordagens para engajar Caio em alguma forma de atividade. A maioria das tentativas falhou. Ele se recusava a sair de casa, a interagir com outras pessoas, e até mesmo a participar das terapias que a equipe médica sugeria.
Uma tarde, Luana teve uma ideia. Ela sabia que Caio gostava de viajar e que antes do acidente ele passava boa parte do seu tempo explorando novos lugares. Se ela conseguisse trazê-lo de volta para esse gosto por aventura, talvez ele começasse a enxergar as coisas de uma nova maneira.
"Que tal uma viagem?", perguntou ela, com um sorriso travesso. "Nada muito distante, apenas uma ida a algum lugar onde você já esteve, mas onde nunca teve tempo de realmente aproveitar."
Caio a olhou com uma expressão cética, mas, pela primeira vez, parecia pensar no assunto. "E você acha que viajar vai me fazer esquecer que eu estou preso a uma cadeira de rodas?"
“Não se trata de esquecer, Caio. Trata-se de lembrar que há vida fora disso tudo", Luana respondeu calmamente.
Ele permaneceu em silêncio por um tempo, como se estivesse ponderando suas palavras. Então, para surpresa de Luana, ele finalmente disse: "Talvez. Mas não espere milagres."
A manhã seguinte foi mais um teste para Luana. Embora ela já estivesse começando a entender as dificuldades que Caio enfrentava, a realidade era implacável. A casa, embora imensa e luxuosa, não escondia a atmosfera de tristeza que pairava no ar. A mansão não era mais apenas um lugar de conforto, mas uma prisão dourada, onde Caio se via limitado por seus próprios pensamentos e pela paralisia que o impedia de fazer o que mais amava: controlar sua própria vida.
Luana entrou no quarto, onde ele já estava esperando, como sempre, em silêncio. A frieza com que ele a encarava ainda a incomodava, mas ela sabia que precisava ser paciente. Ele ainda estava muito preso ao luto por sua antiga vida e se recusava a aceitar a ajuda de qualquer pessoa. Ela queria, acima de tudo, que ele entendesse que a dor que sentia não seria removida, mas poderia ser suavizada com o tempo.
“Hoje é o dia, Caio”, disse Luana, sorrindo suavemente enquanto se aproximava dele, segurando um tablet em mãos. “Eu encontrei uma terapia nova, que pode ajudar a relaxar seus músculos. É uma técnica que estimula os nervos. Quem sabe…”
Ele a interrompeu antes que pudesse terminar. “Terapias. Mais uma, não é? Você realmente acha que essas besteiras vão me curar? Nada vai me devolver o que eu perdi. E você... você está apenas aqui para me fazer sentir que há algo para se salvar, mas no fundo, sabemos que não há.”
Luana sentiu uma pontada de frustração. Ela não sabia como alcançar Caio, como penetrar aquela muralha de raiva e desespero. Ele estava certo sobre uma coisa: nada, nem terapia nem palavras, poderia devolver a ele a vida que ele tinha antes. Mas ela acreditava que havia algo que poderia fazer por ele, mesmo que não fosse uma cura.
“Eu não estou tentando te curar, Caio. Eu só estou tentando fazer com que você sinta que, ao menos, vale a pena tentar um pouco mais a cada dia”, ela respondeu com serenidade, mais do que uma tentativa de convencê-lo, era um compromisso que ela estava fazendo com ela mesma.
Ele a encarou com um olhar vazio, quase como se fosse capaz de ver além das palavras. “E você realmente acredita nisso?”
Luana não sabia o que responder, mas a determinação no seu coração era mais forte do que qualquer dúvida. Ela sabia que, no fundo, ele precisava mais de alguém que o ouvisse do que de um terapeuta ou uma cura milagrosa. Ele precisava de uma chance de acreditar novamente que sua vida tinha algum valor.
O Primeiro Ato de Confiança
Os dias passaram e, lentamente, Luana começou a perceber pequenas mudanças na maneira como Caio interagia com ela. Não eram grandes avanços, mas eram passos, e para alguém tão fechado e em dor, isso já era uma vitória. A resistência dele ainda estava presente, mas não era mais tão forte quanto antes. Ele começava a falar um pouco mais, talvez por necessidade de companhia, ou talvez por sentir que, de alguma forma, Luana era a única pessoa disposta a enfrentar a sua amargura sem julgá-lo.
Em uma tarde quente de sexta-feira, Luana se aproximou de Caio com a ideia de tentar algo novo. “Hoje vamos fazer algo diferente. Vou te levar para o jardim. O sol lá fora está perfeito, e você precisa de ar fresco. Eu sei que é difícil, mas vamos tentar um passo de cada vez.”
Caio a olhou, visivelmente relutante. "Você realmente acha que me tirar dessa cama vai mudar alguma coisa?"
“Não muda nada se você não tentar”, Luana respondeu, com um sorriso tranquilo. “Mas pode ser o começo de algo. O que custa tentar?”
Ele não respondeu imediatamente. Na verdade, parecia que ele estava ponderando se valia a pena se esforçar para algo tão simples. Porém, depois de um longo silêncio, ele falou. “Eu não sei se posso, Luana. E se não for o que eu espero? E se... eu me sentir pior?”
Luana se agachou ao lado dele, de modo que seus olhares se encontrassem diretamente. “Eu não posso garantir que isso será fácil, Caio. Nem posso prometer que você vai se sentir melhor imediatamente. Mas o que eu posso prometer é que, se você não tentar, nada vai mudar. Às vezes, é preciso dar o primeiro passo, mesmo sem saber aonde ele vai nos levar.”
Caio suspirou, mas, surpreendentemente, aceitou. Ele deu seu primeiro passo fora da cama, com a ajuda de Luana, que o orientou com cuidado. O jardim era grande e acolhedor, com flores vibrantes que pareciam dançar com a brisa suave. A sensação de liberdade que ele sentiu foi breve, mas significativa. Ali, em meio à imensidão do espaço, ele experimentou algo que não sentia há meses: um leve alívio. Não era uma cura, mas era um sinal de que talvez houvesse algo mais a explorar além do sofrimento.
Enquanto o empurrava lentamente pela cadeira de rodas, Luana olhou para ele, sorrindo com ternura. “Viu? Não foi tão difícil assim, foi?”
Ele a olhou de volta, com um sorriso tímido nos lábios. “Talvez você tenha razão... Mas não espere que eu vá me tornar um otimista de uma hora para outra.”
Luana riu suavemente. “Eu não espero nada, Caio. Só espero que você saiba que, qualquer que seja o seu caminho, eu estarei aqui para caminhar com você.”
Nesse momento, algo nas palavras dela alcançou o fundo de seu coração. Ele não sabia ainda como lidar com os sentimentos que estavam surgindo, mas, pela primeira vez em muito tempo, ele sentiu uma pequena faísca de esperança.
Quando o sol finalmente apareceu, iluminando o quarto de Gabriel com uma luz suave, ele sentiu que o dia não poderia ser como os outros. Ana tinha ido embora na noite anterior, após uma conversa tensa e cheia de palavras não ditas. Embora houvesse algo em seu coração que queria que ela ficasse, ele sabia que o que havia entre eles não era mais a mesma coisa. Não após a tempestade de sentimentos que tinha tomado conta dele nos últimos dias.
O relógio na parede do quarto fez um som quase imperceptível, mas que parecia ecoar dentro de sua mente. Gabriel se virou para o lado, olhando para o lugar vazio na cama onde Ana costumava se deitar. Ela tinha sido seu suporte por tanto tempo, mas ele sentia que não merecia mais esse apoio. A dor que ele carregava, tanto emocional quanto física, estava corroendo tudo ao seu redor. Ele se sentia como um peso, um fardo que Ana carregava com um sorriso, mas que ele sabia que não conseguia sustentar por mais tempo.
Mas o que ele realmente temia não era perder Ana. Não mais. O que ele temia era perder a si mesmo. A sensação de que ele estava se apagando, que a dor e a incerteza estavam engolindo sua identidade, estava cada vez mais forte. O Gabriel que ele conhecia estava desaparecendo, e quem ele seria quando tudo isso terminasse? Ele não tinha respostas.
Levou-se alguns minutos para reunir forças e sair da cama. Ele se arrastou até a cadeira de rodas e olhou pela janela. O céu estava limpo agora, sem nuvens, mas algo dentro de Gabriel continuava turvo, como uma tempestade à espera de estourar. Ele sabia que precisava tomar uma decisão, mas a ideia de seguir em frente sem Ana ao seu lado parecia impossível. Ela era mais do que uma namorada. Ela era seu alicerce, e ele não sabia mais como construir sua vida sem ela.
Quando o telefone tocou, Gabriel hesitou. Ele sabia que seria ela. Era sempre ela. Mas dessa vez, algo o impediu de atender. Talvez fosse o medo de dizer algo que não queria, ou talvez fosse o receio de ouvir o que sabia que viria. Uma despedida.
E foi exatamente o que aconteceu. Ana deixou uma mensagem. “Gabriel, eu estou indo. Eu preciso de um tempo para pensar também. Acho que você precisa de espaço para decidir o que quer, e eu não posso estar aqui se você não sabe o que quer para a gente. Eu te amo, mas talvez seja hora de dar um passo atrás.”
Ele não sabia se aquilo era um fim, mas sentiu como se fosse o começo de um vazio que ele não sabia como preencher. Ele pensou em ligar de volta, mas as palavras lhe faltaram. Ele estava tão imerso no turbilhão de sentimentos que mal conseguia formar uma frase. O que ele queria dizer? Que o amava? Que não queria deixá-la ir? Mas também sentia que ela estava certa. Talvez fosse hora de enfrentarem a verdade: ele precisava mudar, e ela também. Mas até onde isso os levaria?
O dia passou lentamente, e Gabriel se viu pensando mais em Ana do que em si mesmo. Ele sabia que as coisas precisavam mudar. Precisavam de um novo começo, mas como?
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