Detalhes dos Protagonistas:
Eleonora (Nora) – 22 anos, estudante de literatura. Sempre foi sonhadora e planejou sua vida com cuidado. Quando descobre que tem uma doença rara, vê seus planos desmoronarem. No início, se recusa a aceitar, mas, aos poucos, aprende a enxergar a vida de outra forma.
Miguel – 25 anos, fotógrafo e aventureiro. Vive intensamente, como se cada dia fosse único. O que Eleonora não sabe é que ele carrega um segredo: sofre de uma condição cardíaca que pode matá-lo a qualquer momento, mas se recusa a viver como um "doente".
O relógio marcava 16h45 quando Eleonora ajeitou os óculos e olhou para a tela do laptop. A biblioteca da universidade estava quase vazia àquela hora, e a única companhia que tinha era o barulho suave das páginas sendo viradas pelos poucos estudantes ao redor. Ela revisava sua monografia, algo que planejava concluir nos próximos meses. Tinha tudo organizado: estágio, formatura, mestrado. A vida dela era um roteiro bem escrito.
Ou pelo menos era o que pensava.
Nos últimos meses, as dores de cabeça e o cansaço extremo tinham se tornado frequentes. Ela achava que era só estresse, talvez falta de sono. Mas, quando acordou no chão do banheiro naquela manhã, incapaz de se lembrar de como tinha chegado ali, soube que não poderia mais ignorar.
Foi assim que acabou ali, no hospital, sentada na sala de espera com um livro nas mãos, tentando afastar a ansiedade.
— Você sempre franze a testa assim quando lê, ou esse livro é particularmente irritante?
A voz veio do lado esquerdo, e quando Nora levantou os olhos, viu um rapaz sentado perto dela, sorrindo de um jeito que parecia zombeteiro e, ao mesmo tempo, cativante. Ele tinha cabelos escuros, um pouco bagunçados, e segurava uma câmera no colo.
— O que te faz pensar que pode simplesmente puxar conversa comigo? — ela retrucou, estreitando os olhos.
Ele riu, inclinando-se para frente.
— Bom, geralmente, quando vejo alguém lendo, minha primeira reação não é falar. Mas você parece estar brigando com o livro. Fiquei curioso.
Nora suspirou, fechando o livro.
— Não estou brigando. Só... esperando.
— Médico ou resultado?
Ela hesitou por um segundo.
— Exames.
O sorriso dele vacilou um pouco, mas logo voltou, menos zombeteiro, mais genuíno.
— Entendi. Eu também estou esperando, mas é só um amigo. Que bom que temos um ao outro para nos distrair, né?
Ela bufou, balançando a cabeça.
— Eu nem te conheço.
— Miguel. Agora conhece. E você é...?
Ela não queria se envolver em conversas, muito menos com um desconhecido. Mas algo nele — talvez a forma como parecia confortável, como se aquele hospital fosse um café qualquer — fez com que respondesse:
— Nora.
— Nora... Gosto disso. Mas sabe, acho que você tem cara de outra coisa.
Ela arqueou a sobrancelha.
— Ah, é? O que então?
Ele sorriu, olhando pela janela para o céu nublado.
— De estrelinha.
— O quê? — Ela franziu a testa.
— Você parece alguém que brilha, mesmo sem perceber. Mas tem algo escondido, como se estivesse apagando sua própria luz.
Foi a primeira vez que alguém viu além da fachada organizada e controlada de Nora. E, mesmo sem saber, naquele momento, Miguel se tornou uma parte da sua história.
Nora segurava o envelope branco entre os dedos, sentindo o peso que ele carregava. Seu nome estava escrito no canto, e abaixo dele, as palavras "Resultados dos exames". O consultório do médico estava em silêncio, exceto pelo tique-taque do relógio na parede.
O doutor suspirou, cruzando as mãos sobre a mesa antes de dizer as palavras que mudariam sua vida para sempre.
— Eleonora, os exames mostraram algo preocupante.
Ela prendeu a respiração.
— Preocupante como...?
— Você tem uma doença degenerativa rara. O avanço dos sintomas indica que... bem, que é agressiva. Vamos precisar de mais exames, mas a verdade é que seu tempo pode ser mais curto do que esperávamos.
Curto.
A palavra ecoou na cabeça de Nora como um trovão distante. O médico continuava falando sobre tratamentos, sobre tentar prolongar sua vida, mas tudo o que ela conseguia pensar era "curto". Sua vida sempre fora planejada, medida, organizada. Mas agora, seu futuro havia sido arrancado das suas mãos.
Um Novo Companheiro
Duas horas depois, ainda em choque, Nora caminhava sem rumo pelas ruas da cidade. Ela não queria ir para casa e encarar a pilha de livros sobre sua mesa, os planos que agora pareciam inúteis.
Foi então que viu a plaquinha na vitrine de uma pequena loja:
"Adote um amigo – Filhotes disponíveis."
Sem pensar muito, entrou.
O cheiro de ração e shampoo de cachorro a envolveu, e logo uma funcionária se aproximou, sorrindo.
— Oi! Está procurando um companheiro?
Nora hesitou. Nunca tinha tido um cachorro. Sempre achou que demandava tempo demais. Mas agora, tempo era tudo o que ela queria aproveitar.
— Na verdade, eu... não sei.
Antes que pudesse continuar, sentiu algo encostar em sua perna. Ao olhar para baixo, viu um filhote de Golden Retriever de olhos brilhantes e pelo dourado, abanando o rabo como se soubesse exatamente quem ela era.
— Esse é Sol. — a funcionária disse. — O mais brincalhão da ninhada. Gosta de correr atrás das folhas e roubar meias.
Nora se abaixou, e o filhote deitou a cabeça em seu joelho, como se já fosse dela.
— Sol, hein? — Ela sorriu de leve, sentindo pela primeira vez naquele dia algo além de desespero. — Acho que eu preciso de um Sol na minha vida.
E assim, sem planejar, sem calcular, Eleonora adotou seu primeiro cachorro.
E talvez, só talvez, um novo pedaço de felicidade tivesse entrado em sua vida.
Com Sol aninhado no banco do passageiro, Nora dirigia devagar pelas ruas da cidade. O filhote olhava pela janela, curioso com o mundo ao seu redor, enquanto ela se perguntava se estava mesmo pronta para aquilo.
Parou o carro em frente ao pequeno apartamento onde morava. Ainda segurando o volante, respirou fundo.
— Bem, Sol... Acho que agora somos só eu e você.
O cachorro abanou o rabo, como se entendesse, e lambeu sua mão. Pela primeira vez desde que saiu do hospital, Nora riu de verdade.
Uma Visita Inesperada
No dia seguinte, enquanto organizava a pequena caminha de Sol na sala, alguém bateu à porta.
Nora franziu a testa. Não esperava ninguém. Com um suspiro, foi até lá e, ao abrir, encontrou Miguel parado no corredor, segurando um saco de pão quente e duas xícaras de café.
— Bom dia, estrelinha. — Ele sorriu, levantando o saco. — Trouxe café da manhã.
Nora piscou, confusa.
— Como você sabe onde eu moro?
Miguel deu de ombros.
— Sou um ótimo detetive... Ou talvez tenha perguntado discretamente no hospital.
Ela cruzou os braços, sem conseguir conter o pequeno sorriso.
— Isso se chama ser invasivo.
— Prefiro chamar de preocupado. — Ele entrou antes que ela pudesse protestar e logo avistou Sol, que correu para farejar suas pernas. — Espera... Você tem um cachorro?!
— Adotei ontem. — Nora respondeu, pegando o café que ele oferecia.
Miguel a observou por um instante, seus olhos avaliando algo além da superfície.
— Você recebeu os resultados ontem, não foi?
Ela ficou em silêncio. Miguel suspirou e se jogou no sofá.
— Sabe, tem gente que compra roupas, outros fazem viagens malucas... Mas você decidiu pegar um filhote.
— Foi impulsivo.
— Foi um jeito de não se sentir sozinha.
Ela olhou para Sol, que agora mordia os cadarços do tênis de Miguel.
— Talvez.
— Bom... Seja qual for o motivo, acho que foi uma ótima escolha. Ele parece legal.
— Ele é.
Houve um momento de silêncio confortável. Miguel tomou um gole do café e olhou para ela com um sorriso suave.
— Você tem medo, estrelinha?
Ela baixou os olhos para a xícara nas mãos.
— Tenho. Muito.
Miguel assentiu, como se entendesse.
— Então a gente finge que não tem. Pelo menos por hoje.
E, pela primeira vez desde que recebeu a notícia, Nora sentiu que talvez pudesse fazer isso.
Talvez, com Sol e Miguel por perto, pudesse fingir que ainda tinha um pouco mais de tempo.
Os dias passaram mais rápido do que Nora esperava. Sol crescia cheio de energia, enchendo a casa de pelos e bagunça. E Miguel... bem, ele simplesmente apareceu um dia e nunca mais foi embora.
Sempre que podia, batia à porta com café quente e um saco de pão. Às vezes, levava sua câmera e tirava fotos dela e de Sol. Outras vezes, apenas sentava no sofá e falava sobre qualquer coisa que não envolvesse hospitais ou exames.
E Nora permitia.
Ela não falava sobre a doença. Ele não perguntava. Era um acordo silencioso, um jeito de fingirem que tudo ainda estava normal.
O Dia do Parque
— Você precisa sair mais.
A frase de Miguel veio do nada, enquanto Nora tentava dobrar as roupas recém-lavadas.
— Eu saio. — Ela retrucou.
— Para onde? Para o hospital? Para o mercado? Isso não conta.
— Então o que você sugere?
Ele sorriu, já segurando a coleira de Sol.
— Um passeio no parque. Eu, você e essa bola de pelos. Sem desculpas.
Antes que pudesse recusar, ele já estava prendendo a coleira no filhote e indo em direção à porta. Nora suspirou, mas cedeu.
O parque estava cheio de gente aproveitando a brisa fresca da tarde. Sol corria animado pela grama, latindo para os pássaros e tentando roubar brinquedos de outras crianças.
Nora observava a cena, sentada ao lado de Miguel em um banco de madeira.
— Sabe... eu nunca imaginei que teria um cachorro.
— Nunca? Nem quando era criança?
Ela balançou a cabeça.
— Eu sempre fui muito prática. Cachorros vivem pouco, dão trabalho... Achei que nunca valeria a pena.
Miguel riu baixo.
— E agora? Ainda pensa assim?
Ela olhou para Sol, que pulava no lago tentando pegar um pato imaginário.
— Não. Agora acho que algumas coisas valem a pena, mesmo que não durem para sempre.
Miguel a encarou por um momento, seu olhar mais intenso do que o normal.
— Você vale a pena, estrelinha.
Nora sentiu o coração apertar. Desviou o olhar, fingindo não entender o que ele queria dizer.
Mas ela entendeu. E isso a assustava mais do que qualquer diagnóstico.
O céu começava a ganhar tons alaranjados quando Sol finalmente se cansou de correr pelo parque. Ele se jogou no gramado, arfando, enquanto Miguel e Nora caminhavam lado a lado, um silêncio confortável entre eles.
Nora sentia o peito mais leve. Fazia tempo que não passava uma tarde assim—sem pensar no amanhã, sem se preocupar com exames ou remédios.
— Então, o que você faria se não tivesse um prazo de validade? — Miguel perguntou de repente.
Ela parou de andar.
— O quê?
Ele olhou para ela, sério.
— Se o tempo não fosse um problema. Se você tivesse todo o futuro pela frente... O que faria?
Nora engoliu em seco. Nunca gostara de pensar nisso. Antes do diagnóstico, sua vida era simples, planejada. Depois dele, pensar no futuro se tornou doloroso demais.
Mas Miguel esperava uma resposta.
— Talvez eu viajasse. — murmurou.
— Para onde?
Ela hesitou.
— Paris. Sempre quis ver a cidade à noite. As luzes da Torre Eiffel, os cafés lotados, as ruas de paralelepípedo... Parece mágico.
Miguel sorriu.
— Então por que não vamos?
Ela arregalou os olhos.
— Miguel...
— Não, sério. — Ele parou na frente dela, segurando seus ombros. — Você sempre viveu dentro de uma caixa, planejando tudo. Mas e se, só por uma vez, você fizesse algo sem pensar?
O coração de Nora bateu forte.
Ela queria dizer que era loucura. Que Paris estava longe, que não podia simplesmente largar tudo e ir.
Mas parte dela queria.
Parte dela queria muito.
Sol latiu, interrompendo o momento. Miguel soltou um riso e coçou a cabeça do filhote.
— Acho que ele também quer ir.
Nora riu, mas seus olhos ainda estavam presos aos de Miguel.
Talvez... só talvez... fosse a hora de parar de esperar.
E começar a viver.
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