NovelToon NovelToon

Uma Segunda Chance para Amar

Prólogo

Na vasta extensão do horizonte, onde os prédios de vidro e aço se elevam como titãs a desafiar as nuvens, está a cidade de Lumivale. Uma metrópole pulsante e vibrante, Lumivale é um lugar de incessantes transformações. Suas ruas estão sempre em movimento, repletas de pessoas que vão e vêm, cada uma delas com suas próprias histórias a serem contadas. Os sons de martelos e serras ecoam em cada esquina, enquanto novas construções brotam do chão como flores resistentes, adaptando-se ao sempre mutante cenário urbano.

A arquitetura de Lumivale reflete a fusão do passado e do futuro. Edifícios históricos, com suas fachadas ornamentadas, coexistem com estruturas ultramodernas que desafiam a gravidade. O contraste é evidente nas praças e parques, onde o verde se entrelaça com cada vez mais concreto, buscando um pouco de respiro em meio à agitação. Com cada nova transformação, a cidade revela facetas diferentes, como um camaleão que se adapta ao ambiente, mantendo-se sempre atraente e enigmática para seus habitantes.

No coração de Lumivale, existe uma garota chamada Asa. Uma garota tímida e peculiar. Com cabelos despenteados e óculos grandes que acentuam seu olhar curioso, Asa muitas vezes parece se perder na multidão que a rodeia. Para ela, Lumivale é um paradoxo, um lugar onde os sonhos se entrelaçam com a realidade. Enquanto as luzes da cidade brilham intensamente, Asa encontra conforto nas sombras, onde sua imaginação pode vagar livremente, longe do frenesi que a cerca.

Certa noite, ao voltar da casa de seu namorado, Asa recebeu a ligação de sua irmã gêmea, mais nova por alguns minutos apenas, Alma, era o nome dela.

— Fala. — diz Asa colocando o celular no viva voz enquanto se concentrava na estrada, que por muitas vezes se encontrava movimentada, mas, naquela noite, por incrível que pareça, tinha pouco movimento.

— Nossa, que grossa. Você poderia ser mais carinhosa. — diz Alma.

— Oh, o que a minha queria irmãzinha Alminha quer com esse pobre ser que tenta dirigir concentrada em meio a uma névoa que toma a estrada? Posso acabar batendo o carro se continuar falando ao celular enquanto dirijo.

— Que amor. Você já vem da casa do seu namorado nerd? — diz Alma com ironia.

— Ao falar dele assim, você está falando de mim. Eu e Max temos o mesmo estilo, e só pra deixar claro, não somos nerds, somos apenas pessoas que encontram beleza na curiosidade e se dedicam a entender o mundo ao nosso redor.

— Oh, defendendo o namorado. Estou com ciúmes. — diz Alma. — Ah! Noite do filme hoje, vou fazer pipoca para quando você chegar, já irmos diretamente maratonar crepúsculo.

— De novo? Você não se cansa de assistir aqueles vampiros que brilham? — diz Asa, ela sabia que do outro lado da linha, sua irmã estava revirando os olhos.

— Você pode até achar estranho que os vampiros brilhem como diamantes, já eu, vejo isso como uma bela metáfora para a maneira como a vida pode ser extraordinária, mesmo nas sombras.

— Bla, bla, bla. — diz Asa enquanto ouve sua irmã bufar de raiva do outro lado da linha. — Ok, você desligar. Já estou perto de casa e vamos assistir os seus vampiros extraordinários.

— Você é demais, não demora. — diz Alma rapidamente desligando.

Asa sorri enquanto desliga a tela do celular, desviando seu olhar da estrada por apenas alguns segundos. Mas, ao olhar novamente para a frente, ela se viu envolta por uma densa névoa.

— Mas que porra é essa? — diz Asa, tentando enxergar a estrada a sua frente.

Foi então que, em meio à penumbra, uma sombra emergiu abruptamente em sua linha de visão. O rugido de um motor ressoou como um grito, e, numa fração de segundo, Asa percebeu o perigo. O carro varreu a pista, deslizava, como uma ave presa em uma tempestade, não havia tempo para pensar. O impacto foi abrupto e ensurdecedor, uma colisão entre o efêmero e a fatalidade. Num instante, a bruma a cercava, e no seguinte, seu mundo se tornou uma confusão de luzes piscantes e sombras dançantes.

Asa havia batido de frente com outro carro. O acidente foi feio, e ela estava completamente ensanguentada e atordoada. Com uma força que ela não sabe de onde tirou, ela tentou abrir a porta, mas a mesma estava travada, foi quando ela olhou para o outro carro que também estava completamente destruído, e que, naquele momento, começava a pegar fogo.

O cheiro forte de fumaça e gasolina deixava ela ainda mais fora de si, ela estava perdendo os sentidos pouco a pouco. Asa sabia que não podia dormir, e ela se manteve forte. Porém, não foi forte o suficiente, e tudo de repente virou escuridão.

1

Asa narrando:

2 anos depois...

Acordei com um arrepio. Era como se um vulcão adormecido tivesse se mexido dentro de mim. A escuridão que me envolvia se dissipou lentamente, como a neblina da manhã que se atreve a dar lugar ao sol. Mas, ao contrário de um despertar tranquilo, minha mente era um labirinto de confusão e solidão. Onde estou? O que aconteceu comigo?

Tentei abrir os olhos, mas eles pareciam pesados, como se alguém tivesse colocado um manto de areia sobre minhas pálpebras. Finalmente, após um esforço titânico, consegui forçar uma fenda. A luz era ofuscante, um brilho branco e frio que feriu minha visão. Fechei os olhos novamente, sentindo a fraqueza se arrastar por meu corpo. Era estranho, como se eu estivesse presa entre dois mundos, o real e o desconhecido.

Quando finalmente consegui abrir os olhos completamente, a cena diante de mim era quase surreal. As paredes eram brancas, imaculadas, e o teto parecia elevado como se estivesse flutuando no ar. Tudo cheirava a desinfetante, um odor que eu mal conseguia identificar. Tentei me mover, mas meu corpo não obedecia. Uma onda de pânico começou a tomar conta de mim.

— Calma, Asa... — sussurrei para mim mesma, mas a voz que saiu de meus lábios estava tão distante que me perguntei se realmente havia falado. O som soou como um eco de um sonho, uma lembrança de algo que não era mais real. O que "Asa" significava? O que eu era? O que eu tinha sido?

Tentei pesquisar em minha mente por fragmentos de memória, mas tudo o que consegui encontrar foi um vazio profundo. Imagens começaram a vir e se dissipar como fumaça. Eu via rostos, sorrisos, até mesmo lágrimas, mas eram tão etéreos que não consegui reconhecer ninguém. Um nó se formou em minha garganta; a sensação de não pertencer a lugar algum era avassaladora.

Os batimentos do meu coração começaram a acelerar, fazendo meu peito retumbar como um tambor guerreiro. Olhei ao redor, em busca de qualquer indício de quem eu fosse ou do que poderia ter acontecido. Foi quando percebi algo: havia aparelhos ao meu redor, uma teia de fios e luzes piscantes. O som constante de um monitor preenchia a sala, marcando o tempo como um contador silencioso de meu estado de vida. Aquilo era um hospital. Eu estava em um hospital.

As lembranças começavam a voltar, mas não como uma onda suave e familiar, e sim como relâmpagos rasgando a escuridão. Balanços, risos, uma luz ofuscante... e então, um acidente. Um momento. Uma saída de estrada. A dor. Eu podia sentir, quase como se ainda estivesse presa àquela experiência. Meu coração afundou na solidão de saber que tinha perdido tanto.

Meu olhar se fixou em um canto da sala, onde havia um pequeno quadro com flores que lembravam a primavera. Eram tão vibrantes em contraste com a brancura estéril ao meu redor. Desejei poder alcançar as flores, tocá-las, sentir sua textura suave entre meus dedos. Mas tudo o que eu conseguia fazer era me deixar perder na confusão dos sentimentos: medo, solidão, e uma esperança primordial que me puxava para a vida.

A porta se abriu com um rangido suave, e vi a silhueta de alguém se aproximando.

Uma figura feminina entrou no meu campo de visão. Seu cabelo, uma cascata de fios castanhos, parecia brilhar sob a luz suave, e seu rosto carregava uma expressão de incredulidade. A mulher vinha em minha direção, mas não conseguia lembrar quem era. Um misto de confusão e alívio percorria meu corpo.

— Quem... quem é você? — Eu murmurei, a voz saindo baixa e arrastada, como se a própria pronúncia das palavras exigisse um esforço colossal.

Ela parou, congelada. Um momento que parecia se estender por uma eternidade. E então, enquanto eu a estudava, uma centelha de reconhecimento acendeu dentro de mim. A lembrança veio lenta e titubeante, mas finalmente se consolidou. Era ela. Minha mãe.

— Mãe? — A palavra saiu quase como um sussurro, uma pergunta e uma afirmação ao mesmo tempo.

Seus olhos se encheram de lágrimas, e, num movimento súbito, ela se aproximou e me abraçou. O calor e a fragilidade de seu corpo contra o meu fizeram o tempo parecer desvanecer. Naquele abraço, havia uma mistura potente de amor, alívio e dor. Eu podia sentir o tremor de sua respiração, a fragilidade que deixava evidente que algo muito maior do que um simples afastamento nos separara.

— Ah, minha Asa! — ela exclamou, sua voz embargada. — Você está acordada! Eu pensei que nunca mais...

O afeto de sua presença dissolveu parte da confusão que me envolvia, empurrando algumas perguntas para a superfície.

— O que aconteceu? Por que eu estou aqui? O que aconteceu comigo?

A expressão dela mudou, e as lágrimas começaram a escorregar por sua bochecha.

— Você... você estava em um coma, — ela informou, cada palavra carregando um enorme peso. — Depois do acidente de carro. Dois anos, minha querida...

Dois anos. O tempo havia passado como um vaso quebrado, cada fragmento um dia perdido em um abismo que me separava do mundo. Eu amaldiçoei a ausência de lembranças, as lacunas que tornavam tudo ainda mais doloroso.

— Eu não sei... Eu não lembro de nada. — A angústia imediatamente tomou conta, e minha voz saiu mais alta do que pretendia. — Eu só me lembro de... nada. Como se tudo tivesse sido apagado.

Ela segurou minha mão, as dela quentes e reconfortantes, como uma âncora em meio à tempestade que se formava em meu coração.

— Está tudo bem, querida. Estamos juntas agora. E isso é o que importa.

A presença reconfortante da minha mãe foi como um porto seguro em meio à tempestade. Mas à medida que a confusão dissipava, outras perguntas surgiam como ondas implacáveis em minha mente.

— Onde está meu namorado, Max? — Perguntei, minha voz um pouco mais firme agora, mas ainda carregada de apreensão.

A menção de seu nome trouxe um turbilhão de emoções, lembranças de sorrisos e toques suaves. Um amor que agora parecia tão distante quanto uma estrela em uma noite nublada.

A reação da minha mãe foi imediata. Ela parou, uma sombra de incerteza cruzou seu rosto, como se uma lâmina de gelo tivesse cortado o ar entre nós. Seu olhar desviou, caindo diretamente na janela, como se as respostas estivessem ali.

— Mãe? — A palavra saiu arrastada, uma súplica amarga. — Onde ele está? Aconteceu algo?

Foi então que a porta se abriu silenciosamente, e Alma entrou. O ambiente que até então respirava a cura, o renascimento, passou a vibrar com uma tensão palpável. Minha irmã estava diferente — uma nova luz a cercava, mas havia algo inegavelmente diferente. Ela carregava uma barriga saliente, um símbolo de vida que crescia.

— Alma? — Falei, a voz falhando. Não conseguia processar a imagem diante de mim. Apesar da natureza feliz da gravidez, uma tristeza profunda se instalou no meu coração. — Você está grávida?

Ela assentiu lentamente, um sorriso tímido tentando se formar em seus lábios. Mas a alegria que deveria acompanhar a revelação estava envolta em um véu de desconforto. Acompanhei a gesticulação dela enquanto olhava para minha mãe, que parecia presa em um mar de palavras não ditas.

— Como... como isso aconteceu? Por que vocês parecem estar com medo de algo? — Eu perguntei, a lembrança do meu coma pesando mais do que nunca sobre mim. O tempo havia se desdobrado em um intervalo que não pude alcançar. Para mim, eram apenas alguns dias — como uma noite que durou uma eternidade.

— O acidente... tudo isso... — Alma começou, mas as palavras não pareceram se formar. O ar no quarto havia se tornado pesado, uma névoa de sentimentos que quase podíamos tocar. Minha mãe olhou para Alma, e no silêncio do quarto, o tempo pareceu parar. Nada além do batimento cardíaco das máquinas, que agora soavam como um eco doloroso, preenchia o espaço.

Finalmente, minha mãe respirou fundo e se virou para mim, como se estivesse se preparando para oferecer um presente e um fardo ao mesmo tempo.

— Asa, nós... — Minha mãe começou a falar com dificuldade.

— Fala logo, aconteceu algo? Por que estão enrolando para falar — Perguntei, um peso esmagador se estabelecendo em meu peito.

Alma se aproximou, hesitante, e colocou sua mão na minha.

A mão de Alma estava quente, um toque que deveria ser reconfortante, mas em vez disso, trouxe uma onda de angústia que me fez querer recuar. Colocamos tudo em perspectiva, mas o clima pesado permanecia no ar, nas entrelinhas do que ainda precisava ser dito. Alma parecia hesitante, como se carregasse um peso que não sabia como dividir.

— Por que tanto suspense, Alma? — perguntei, tentando manter minha voz estável, mas o tremor traia a calma que eu tentava sustentar. — Parece que há algo que vocês não estão me contando.

O silêncio se estendeu novamente, e por um breve momento, os rostos ao meu redor estavam congelados em uma bruma de confusão. A expressão de Alma alternava entre a dor e a empatia, como se estivesse prestes a soltar uma revelação que poderia despedaçar o que restava da minha sanidade.

— Porque... porque a verdade é difícil, Asa, — disse ela, finalmente rompendo o silêncio, mas suas palavras pareciam mais como uma defesa do que uma explicação. — Às vezes, a verdade é... brutal.

— Brutal? — Eu repeti, o coração acelerando. Em algum lugar dentro de mim, algo começava a se formar, uma percepção tênue que me fazia querer me afastar, como se o mundo estivesse prestes a desabar.

— Sim. Eu... não sei como dizer isso, mas... meu filho, — ela começou, a voz embargada. — é do Max.

As palavras dela ressoaram como um trovão em uma tempestade silenciosa — cortantes e devastadoras. O significado pesado da sua afirmação me atingiu em cheio, e a realidade despedaçou o que restava das minhas expectativas. Uma onda de desespero preencheu meu peito, e a sala pareceu girar em torno de mim.

— Não... não pode ser, — murmurei, as lágrimas brotando em meus olhos. — Você não pode estar falando sério. Max... meu Max?

— Eu sinto muito, Asa. Eu... Você estava em coma, e a vida continuou. Ele... ele se envolveu com você, mas quando você... quando você estava fora... — Alma se interrompeu, as palavras pesadas quase impossíveis de serem pronunciadas.

O choque azedou o ar. A densidade do momento cresceu, um colapso que eu não estava preparada para enfrentar. O amor que eu tive, o que pensava ainda existir, agora se desfazia diante da crueldade da realidade. Max havia escolhido continuar a viver enquanto eu estava aprisionada em um sonho profundo.

— Por quê? — Eu perguntei, o fio de voz preso na garganta.

— Eu não queria te machucar! Aconteceu e foi tudo tão difícil... estávamos perdidos e acabamos passando muito tempo juntos. Uma coisa levou a outra e tudo isso aconteceu. Me perdoa... — Alma implorou, o desespero em sua expressão refletindo a dor que estava me consumindo. — Ninguém sabia se você ia acordar, Asa! E quando você acordou...

— Quando eu acordei? — Eu a interrompi, a raiva e a dor lutando pelo controle da minha voz. — Agora a culpa é minha? — As lágrimas começaram a rolar livremente pelo meu rosto.

Eu estava perdida em um mar de traição. Agora meu mundo desabava. Meu coração estava quebrado e despedaçando como folhas caem de uma árvore no outono — secas, quebradiças e, de alguma forma, mortas.

A conexão entre nós esvanecia-se rapidamente, e o peso das revelações crescia, tornando-se insuportável. Minha mãe observava em silêncio, o olhar carregado de compreensão e empatia, mas o que isso importava agora? O amor que eu tinha, o futuro que eu idealizava, tudo desmoronava.

— Eu não sei se consigo lidar com isso, — confessei, a voz quase inaudível. O choque e a traição inundavam meu corpo, um labirinto de sentimentos que me deixava perdida. — Vocês me trairam de uma forma tão cruel ... não posso acreditar!

Alma estava em lágrimas, a mão ainda firme na minha como um porto na tempestade.

— Por favor, Asa... tente entender. Ninguém queria que isso acontecesse. Eu não queria isso. Eu só queria que você estivesse bem.

— Bem? Você não entende, Alma! Como é acordar de um coma, confusa e totalmente perdida. E o pior, descobrir que enquanto você lutava pela sua vida, sua irmã estava trepando com o seu namorado.

Nesse momento, o mundo em que eu existia, repleto de amor e esperança, desmoronou. O presente se tornou uma visão borrada, e o futuro que eu havia imaginado se evaporou em um sopro. As revelações estavam consumindo tudo, e me deixava vazia.

Era uma nova realidade, uma nova vida, mas que vida? O que me restava, senão a dor e a perda, enquanto o eco das risadas que compartilhava com Max se tornava um eco distante, como um sonho que nunca voltaria?

E enquanto o peso das verdades pairava sobre nós em um silêncio tenso, percebi que o verdadeiro desmoronamento havia começado e, com ele, uma nova jornada que eu não escolhi.

2

Asa narrando:

O peso do silêncio foi rompido por um grito que reverberou pelas paredes do quarto.

— Saia! Eu não quero mais te ver! — exclamei, minha voz carregada de um mix de dor e raiva. A força em minhas palavras era uma revelação, um lado meu que nunca havia se manifestado antes. Fiquei paralisada, sabendo que esse era um momento crucial, uma ruptura que eu não poderia ignorar. Cada sílaba era como um eco de traição, e a rejeição cortou mais fundo do que qualquer adjetivo que eu pudesse descrever.

O ar no ambiente ficou pesado, e a agitação entre nós três aumentou. Minha mãe, sempre a pacificadora, tentava intervir, mas a tensão era palpável. Ela caminhou até nós, as mãos levantadas em um gesto de súplica.

— Calma, vocês duas! Por favor, vamos conversar com calma. Asa, você precisa se acalmar. Essa situação é muito difícil para todos nós. — ela disse, a voz uma mistura de preocupação e amor.

Mas eu não conseguia ouvir. Apenas a traição perfurava meu pensamento, e a sensação de que minha vida inteira estava sendo modificada diante de mim era quase insuportável. Olhei para Alma, a raiva fervilhando em mim como um vulcão prestes a entrar em erupção.

— Como você pôde fazer isso, Alma? Você me traiu da forma mais cruel possível! Meu namorado, a pessoa que deveria estar ao meu lado, e você se escolheu! — A última palavra saiu como um sopro de veneno, e eu sabia que não havia volta. — Você o chamava de nerd, zoava ele de várias maneiras possíveis.

— As coisas são diferente agora... Max mudou e ele agora é meu. Desculpa, mas aconteceu. — Alma estava chorando, as lágrimas em seu rosto misturavam-se com a raiva que deixava seus olhos tão claros.

— E eu? O que sou eu nessa história? Apenas uma espectadora da vida de vocês dois? — Eu explodi, a um passo de ceder a um impulso de ira que estava prestes a me consumir. — Você pode não ter planejado, mas não me diga que não sabia que isso poderia me destruir!

Nesse instante, minha mãe, em um gesto desesperado, começou a procurar a campainha que chamava as enfermeiras.

— Calma, Asa. Vou chamar uma enfermeira. Talvez você só precise de um pouco de ajuda para relaxar. Por favor. — Ela implorou, quase em um sussurro.

Mas as palavras da minha mãe eram muito distantes, perdidas na tempestade de emoções que me cercava. Mergulhei em um ciclo de fúria e dor, relembrando os momentos que eu pensava serem sagrados, agora manchados por uma traição que nem mesmo a realidade poderia apagar.

As enfermeiras chegaram rapidamente, e vi uma delas trazer uma seringa com um calmante. Era como se o mundo estivesse prestes a desaparecer em uma nuvem de névoa. Fui empurrada delicadamente para baixo, mas a resistência dentro de mim era teimosa.

— Não! Eu não quero isso! — gritei, tentando me afastar do que estava prestes a acontecer. Vidas estavam se desmoronando ao meu redor, e a ideia de sucumbir a um sono profundo, enquanto tudo isso acontecia, parecia errado.

— Se você não se acalmar, isso vai só piorar. — A enfermeira disse de forma calma, mas firme. Percebi que, em meio ao tumulto, a única coisa que eu realmente queria era a liberdade de sentir, mesmo que a dor fosse insuportável.

— Max... — murmurei, o nome escapando de meus lábios com um peso que quase não consegui suportar. O vazio que agora ocupa seu lugar em meu coração era insuportável.

Mas o veneno já estava correndo em minhas veias. O ambiente começou a girar, e a confusão me envolveu, como uma nuvem que cobria tudo. As vozes de Alma e da minha mãe distorciam-se em ecos desconhecidos. Cada palavra perdeu seu significado. Lutei para permanecer consciente, para resistir à escuridão que se aproximava, mas era como tentar segurar a areia entre os dedos.

— Eu... eu te amo, Asa. — a última coisa que ouvi, mas não sabia se era de Alma ou da minha mãe. E então a névoa se consolidou, consumindo minha consciência, e eu sucumbi em uma escuridão confortável, apenas para me livrar da dor que me consumia.

E, com isso, a última fração da minha realidade se desfez, deixando para trás apenas uma tristeza profunda e uma confusão que se desdobraria quando eu acordasse novamente.

[...]

Despertei com uma sensação estranha. A luz do quarto de hospital me cegava momentaneamente, forçando-me a piscar várias vezes até que minha visão se ajustasse. Minhas lembranças eram fragmentadas, como peças de um quebra-cabeça espalhadas por uma tempestade.

A enfermeira havia me dado calmamente, isso me fez apagar e por algum tempo, me fazendo esquecer o que eu estava passando. Não que isso importasse agora. Meu coração ainda pulsava descontrolado, a raiva e a dor se misturando em minhas veias. A notícia que recebi logo após acordar ainda ecoava na minha mente: minha irmã, minha própria irmã, estava grávida do meu namorado. Ex-namorado, corrigi mentalmente, sentindo um gosto amargo na boca.

Enquanto tentava processar tudo isso, a porta do quarto se abriu lentamente. Lá estava ele, parado como uma estátua. Seus olhos encontraram os meus e, por um momento, parecia que o tempo tinha congelado. Ele estava diferente. Não era mais o garoto nerd que eu lembrava, mas sim alguém irreconhecível. O corpo tatuado, os músculos que agora definiam sua figura, tudo nele gritava mudança.

— Então, é assim que você aparece depois de tudo? — Minha voz soou mais firme do que eu esperava, cortando o silêncio entre nós.

Ele hesitou, abrindo a boca como se fosse falar, mas eu não lhe dei essa chance.

— Você mudou tanto, não é? Do nerd tímido ao... isso. — Eu gesticulei vagamente, indicando sua nova aparência. — Interessante como as pessoas se transformam quando acham conveniente. Inclusive, traem os outros pelas costas. Como alguém consegue ficar com uma mulher que fazia bulling, que te zoava e, acima de tudo, irmã da mulher que ele jurava amar. E que no momento mais vulnerável dela, ele estava traindo ela da maneira mais nojenta e repugnante?

Ele deu um passo à frente, mas eu ergui a mão para interrompê-lo.

— Não, você não tem o direito de dizer nada. Você e minha irmã... Vocês se merecem.

A dor em seu olhar era palpável, mas eu não estava disposta a suavizar minhas palavras.

— Eu confiava em você. E enquanto eu estava aqui, lutando pela minha vida, você escolheu a pior traição possível.

Ele finalmente encontrou a voz, mas suas palavras eram frágeis, quase sussurradas.

— Asa, eu...

— Não! — cortei, minha raiva queimando qualquer tentativa de desculpas. — Eu não quero ouvir. Você pode ter mudado por fora, mas por dentro, você é o mesmo covarde.

O silêncio se instalou novamente, pesado e sufocante. Eu não sabia se ele tinha mais algo a dizer, mas naquele momento, não importava. Ele havia cruzado uma linha, e não havia retorno.

— Saia. — eu disse, a palavra soando definitiva. — E não volte.

Ele hesitou por um instante, mas então, como se finalmente entendesse a gravidade de suas ações, virou-se e saiu sem olhar para trás.

Sozinha novamente, deixei que as lágrimas que eu segurava finalmente caíssem. A dor ainda estava lá, mas a raiva também. E eu sabia que, de alguma forma, conseguiria me reconstruir a partir dos pedaços que restaram.

[...]

Manhã seguinte...

A luz suave da manhã filtrava-se pelas cortinas do quarto de hospital, lançando sombras delicadas nas paredes. Eu ainda estava tentando processar tudo o que havia acontecido quando a porta se abriu novamente. Desta vez, era o médico, seguido de perto por minha mãe.

O rosto dela estava marcado pelo cansaço, mas seus olhos brilhavam com um amor inabalável. Ela se aproximou da minha cama, segurando minha mão com uma ternura que só uma mãe poderia oferecer.

— Bom dia, Asa. — o médico começou, olhando para mim com um sorriso encorajador. — Como você está se sentindo hoje?

— Estou... tentando entender tudo. — respondi, minha voz um pouco rouca.

Ele assentiu, compreensivo.

— Eu sei que é muita coisa para absorver. Mas há algumas questões importantes que precisamos discutir.

Minha mãe apertou minha mão, como se quisesse me dar força. O médico continuou:

— Devido aos dois anos em coma, seu corpo passou por algumas mudanças. Precisaremos realizar alguns exames para avaliar sua saúde geral.

Assenti, já esperando algo assim.

— E quanto à minha mobilidade?

— Precisaremos começar com fisioterapia o mais rápido possível. — ele explicou. — O tempo que você passou deitada pode ter afetado seus músculos e articulações. Será um processo gradual, mas nosso objetivo é ajudá-la a recuperar sua força e independência.

A ideia de passar por tudo isso era assustadora, mas também senti uma faísca de determinação. Eu queria minha vida de volta.

— Entendo. — murmurei. — Estou disposta a fazer o que for necessário.

Minha mãe me olhou com um orgulho que aqueceu meu coração.

— Estamos aqui para você, Asa. A equipe médica estará sempre cuidando de você até estar liberada e finalmente poder sair deste hospital. — diz o médico com um sorriso gentil.

Ele continuou explicando os próximos passos, os tipos de exercícios que eu faria e a equipe que estaria ao meu lado durante a recuperação. Embora o caminho à frente parecesse longo e desafiador, havia uma sensação de esperança crescendo dentro de mim.

Quando o médico saiu, minha mãe permaneceu ao meu lado, acariciando minha mão.

— Você é forte, Asa. Sempre foi. E agora não será diferente. — diz ela. — Quero que saiba que nunca aceitei o que aconteceu. Só quero que você supere tudo e que finalmente possa seguir sua vida.

Eu assenti, a raiva voltando novamente a tona.

Eu sabia que haveria dias difíceis, momentos de dúvida e frustração, mas, eu também sabia da minha força e determinação, eu iria dar a volta por cima.

— Obrigada, mãe. — sussurrei, sentindo-me grata por sua presença constante. — Vamos conseguir.

E naquele instante, decidi que faria tudo o que estivesse ao meu alcance para me reerguer. Eu estava pronta para lutar pela minha vida.

[...]

O silêncio era quase ensurdecedor, mas, de alguma forma, ele me permitia ouvir a mim mesma com clareza.

Era noite e eu estava sozinha naquele quarto de hospital.

Olhei para o teto, as pequenas manchas e marcas se tornaram um mapa de minhas reflexões. Nunca havia passado tanto tempo sozinha, e, ironicamente, essa solidão estava me fazendo companhia de uma forma estranha. Era como se, finalmente, eu pudesse me desvencilhar das vozes externas que sempre tentavam me guiar, me moldar. Agora, só havia eu e as minhas memórias.

Pensar na minha vida era como folhear um álbum de fotografias desbotadas. Cada imagem trazia à tona risos e lágrimas, amores e desilusões. Eu me lembrava de cada coração partido, das promessas feitas e quebradas. A verdade era que eu estava cansada. Cansada de me arriscar, de abrir meu coração e me expor, apenas para ver tudo desmoronar. O amor, que um dia me parecia um céu azul, agora era uma tempestade, e eu não tinha mais vontade de me molhar.

Quando eu sair daqui, quero mudar. Quero respirar livremente, sem o peso das expectativas. Quero descobrir quem sou fora das relações e dos rótulos que a sociedade impôs a mim. A ideia de viver por mim mesma, de encontrar alegria nas pequenas coisas, começou a ganhar forma. Eu poderia explorar os meus hobbies, redescobrir paixões que deixei para trás. Talvez eu voltasse a dançar balé, ou quem sabe escrever um livro, onde cada palavra seria uma nova forma de me libertar.

A verdade é que eu não queria mais me envolver amorosamente com ninguém. A dor de um coração partido ainda ecoava dentro de mim, e não havia espaço para mais feridas. Eu desejava um amor maior, um amor que não dependesse de outra pessoa. Um amor por mim mesma, um amor que me curasse e me fortalecesse.

Enquanto o tempo passava lentamente, eu me permiti sonhar com o futuro. Imaginei um lugar onde eu poderia ser livre, onde as cores da vida não estivessem opacas, mas vibrantes. Um espaço onde eu poderia me reinventar, onde o passado não ditasse quem eu sou.

Então, deitada na cama do hospital, fiz uma promessa silenciosa a mim mesma.

Um acidente não conseguiu me vencer, então por que eu deixaria que meu ex-namorado e minha irmã traidora me derrubassem? Eles acham que podem me machucar, que podem me fazer sentir menos do que sou. Mas eu sou mais forte do que isso. Cada cicatriz que carrego é uma prova de que sobrevivi, de que enfrentei desafios maiores. Não vou permitir que essas traições me definam. Eu sou a dona da minha história, e ninguém vai tirar isso de mim.

Para mais, baixe o APP de MangaToon!

novel PDF download
NovelToon
Um passo para um novo mundo!
Para mais, baixe o APP de MangaToon!